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Revista FONAMEC

- Rio de Janeiro, v.1, n. 1, p. 200 - 224, maio 2017

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A indisponibilidade e a supremacia do interesse público nas causas

que envolva a pessoa jurídica de direito público não remonta à indisponi-

bilidade do processo ou do procedimento legal; além disso, nem sempre

a Administração Pública litigará em causa envolvendo direitos marcados

pela indisponibilidade.

56

Os meios de garantir os interesses da coletivi-

dade são disponíveis e suscetíveis à escolha do administrador público,

57

que ostenta um poder-dever discricionário de buscar o melhor meio de

garanti-los.

58

Um pouco mais a fundo, a doutrina tem compreendido que

a regra geral é que os direitos envolvendo interesses públicos podem ser

submetidos às instâncias autocompositivas, uma vez que essa indisponi-

bilidade não seria absoluta,

59

apontando-se como barreira à negociação

material a existência de previsão legal específica que vede a sua prática.

60

Trata-se de argumento favorável ao sustento dos negócios processuais

realizados pela Administração Pública, haja vista que, nas causas de in-

teresse público, os direitos seriam, sob essa ótica, indisponíveis, porém

transacionáveis.

61

Todavia, aos fins de aproximar convenções processuais

56 Significativa alteração que confirma o exposto foi operada na Lei de Arbitragem, seara que exige patrimonialidade

e disponibilidade de direitos.

57 “Cada advogado público, que tem poder para praticar atos processuais pode celebrar negócios processuais. Se o

advogado público pode convencionar a suspensão do processo, escolher o procedimento a ser adotado, o meio de

impugnação a ser utilizado, é porque pode celebrar negócio processual.” CUNHA, Leonardo Carneiro da.

A Fazenda

Pública em Juízo

. 13. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2016, p.663.

58 Consoante enfatiza Marco Antonio Rodrigues: “[...] pode-se afirmar que a indisponibilidade do interesse público

não configura óbice à utilização de meios consensuais à solução de controvérsias ou à arbitragem. Ao contrário, tais

mecanismos podem promover uma tutela mais adequada ao interesse público em jogo. [...] Da mesma forma não

há um óbice geral e abstrato que impeça a celebração de convenções processuais. ”

A fazenda pública no processo

civil

, 2. ed. Rio de Janeiro: Atlas, 2016, p.376; p.379.

59 Em sentido contrário: MARTINS JUNIOR, Wallace Paiva.

Probidade administrativa

. 2. ed. São Paulo: Saraiva, 2002,

p.362-363; LISBOA, Roberto Senise.

Contratos Difusos e Coletivos

. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1997, p.203.

60 Discussão relevante gira em torno do artigo 17, § 1º da Lei n. 8.429/92 (Lei de Improbidade Administrativa), que

veda a possibilidade de transação, acordo ou conciliação nas Ações de Improbidade Administrativa. Importante es-

clarecer que o diploma em análise, quando de sua gênese, sofreu a influência de uma concepção de supremacia do

interesse público que não autorizaria soluções autocompositivas. O referido dispositivo chegou a ser expressamente

revogado pela Medida Provisória n. 703/2015 (artigo 2º, I), a qual alterara a Lei 12.846/13 (Lei Anticorrupção); entre-

tanto, aquela MP não foi convertida em lei, tendo perdido sua vigência em 29 de maio de 2016. No entanto, mesmo

com a subsistência daquele dispositivo, parece que a possibilidade de sua relativização restou ainda mais clara, dada

constitucionalização do direito administrativo e a previsão dos acordos de leniência previstos nos artigos 16 e 17 da

referida Lei Anticorrupção, que podem ser firmados junto aos infratores do ato ilícito. É certo que nem sempre o ato

de improbidade pode repercutir na esfera criminal do réu; contudo, caso isso aconteça, haveria a possibilidade de

concessões na seara penal, mas não no juízo das ações de improbidade. Como se pode perceber, mesmo em tema

tão sensível, segue a tendência de flexibilização do conceito de indisponibilidade material do direito.

61 V. RE n. 253-885-0/MG, Rel. Min. Ellen Gracie, relativizando o princípio da indisponibilidade dos bens públicos:

“Poder Público. Transação. Validade. Em regra, os bens e o interesse público, são indisponíveis, porque pertencem à

coletividade. É, por isso, o administrador, mero gestor da coisa pública, não tem disponibilidade sobre os interesses

confiados à sua guarda e realização. Todavia, há casos em que o princípio da indisponibilidade do interesse público

deve ser atenuado, mormente quando se tem em vista que a solução adotada pela Administração é a que melhor

atenderá à ultimação deste interesse”

.

Data Publ. 21.06.02. Disponível na íntegra em: http: /

/www.stf.jus.br

, acesso

em: 12 dez. 2015.