

Revista FONAMEC
- Rio de Janeiro, v.1, n. 1, p. 200 - 224, maio 2017
215
Por tal razão, um dos elementos atribuidores de licitude ao objeto
dos acordos processuais alude à
impossibilidade de prejudicar o direito
material em certo grau indisponível ou a sua tutela em juízo
. Essa inter-
pretação parece-nos mais adequada porque permite a celebração de con-
venções processuais mesmo em causas envolvendo direitos indisponíveis
e não transacionáveis, sem que se permita o prejuízo do direito material
indisponível ou a sua tutela em juízo.
46
Um exemplo são os ajustes processuais sobre o direito de família
quando a indisponibilidade do direito versado não permitir qualquer tipo
de autocomposição, equivalente aos direitos da personalidade
stricto
sensu
, emanados da dignidade humana. Dentro desse contexto, não há
óbice,
e.g.
, de convencionar acerca da extensão de prazo para a prática de
ato processual em benefício do menor, tal como a inversão da ordem de
produção de provas no resguardo do interesse do menor, a ampliação dos
meios de prova etc.
A concepção de “direitos indisponíveis que admitam a autocom-
posição” coaduna-se com o desenho da jurisdição contemporânea, que
abre espaços a uma ordem jurisdicional consensual mesmo nas relações
publicistas onde há presença de interesses públicos e sociais (como no
direito processual), rompendo com a ordem impositiva desligada da ideia
de prospecção e da falta de consciência do importante compromisso que
o poder judiciário desempenha para a tomada de decisões com reflexos
políticos, de modo a orientar os comportamentos da sociedade
pro futuro
– diminuindo-se a litigiosidade –.
Converge com a ideia de Estado constitucional, erigido a partir do
binômio liberdade e igualdade, ambiente adequado de horizontalização
das relações entre indivíduo e Estado, entre Administração e administra-
do, e a propensão à consensualidade, coordenando com harmonia: fun-
ção jurisdicional, democracia, tutela de direitos, eficiência, interesses pú-
blicos e privados e realidade social, política e cultural.
A Lei de Mediação (Lei n. 13.140/2015) é promulgada com respaldo
nesse realinhamento contextualizado de valores da atual configuração da
sociedade e do direito. De acordo com o artigo 3º do diploma, será pos-
sível se valer das técnicas da mediação tantos nos conflitos que versarem
46 GRECO, Leonardo.
Instituições de processo civil – Introdução ao direito processual civil,
v. 01, 5. ed. Rio de Janeiro:
Forense, 2015, p.280; CÂMARA, Marcela Regina Pereira. A contratualização do processo civil? In:
Revista de Proces-
so
, v.194. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2011, p.408.