Revista FONAMEC
- Rio de Janeiro, v.1, n. 1, p. 384 - 406, maio 2017
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dade do Estado Moderno, esse caminho, sutil e profundamente, acabou
aumentando sua capacidade controladora, na medida em que aumentou
os seus “tentáculos”.
Sobre isso, veja o que, com sagacidade, percebeu Louis Assier-An-
drieu, uma vez mais citado:
Há, por traz dessa desconfiança nos tribunais, nas suas pom-
pas e nos seus hermetismos, muita ingenuidade. […] não é
porque se soluciona uma pendência fora do tribunal que ela
é solucionada fora do Estado e fora de seu direito.
O modo
estatizado de organização da sociedade aceita
o pluralismo
interno do direito
[...] o próprio direito oficial, institucional,
“jurídico!”, conhece, consagra e organiza as soluções ditas
alternativas [...]. Confere-lhe importância maior ou menor,
concede-lhe maior ou menor reconhecimento […] o caráter
alternativo das outras soluções que não o julgamento pro-
vém, portanto, mais da afirmação ideológica do que da cons-
tatação sociológica: alternativo ao quê? Por certo não ao Es-
tado de direito. O direito estatal, em outros termos, não opõe
nenhuma barreira contra soluções alternativas.[...]”
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É nesse cenário que nascem, modernamente, os modos ditos al-
ternativos de resolução dos conflitos. Afinal, desde que o poder decisório
“privado” opere dentro da perspectiva estatal e resolva os conflitos den-
tro de alternativas suportáveis pela ordem, o Estado não tem com o que
se preocupar, mesmo porque, apesar de não decidir diretamente, acaba
capilarizando o controle que exerce, pela transformação de organizações
e indivíduos em seus colaboradores e agentes.
Assim, por exemplo, nada demais há no fato de que os homens
possam, por si só, resolver um conflito de propriedade. Basta que enten-
dam que tal conflito deve ser resolvido a partir da aceitação prévia das
regras do jogo, todas produzidas ou chanceladas pelo Estado. E as regras
do jogo não se prestam a discutir, por exemplo, porque há proprietários
e não proprietários. A propriedade, como o fato social de assenhorar-se
de alguma coisa, é reduzida à apropriação individual e legítima, à medida
que sua aquisição se dê por uma das formas estabelecidas no Código Civil
e tenha a destinação prevista pela Constituição.
44 Op. Cit., p. 190, 195 e 196.