

Revista FONAMEC
- Rio de Janeiro, v.1, n. 1, p. 200 - 224, maio 2017
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Não restam dúvidas, após a leitura do dispositivo supra do
CPC/2015, que este converge com o entendimento segundo o qual a con-
cretização do acesso à justiça se efetiva por meio de decisões adequadas,
resultantes do processo de envergadura garantista
não
restrito aos limites
institucionais do poder judiciário e, se dentro dele, não coaduna com a
ideia de que o procedimento só possa refletir o modelo padrão previsto
na lei, sem que seja possível, pela manifestação de vontade das partes,
que estas interfiram na conformação dos atos processuais.
Na realidade, desponta-se o estímulo a técnicas apropriadas à fil-
tragem do conflito para a verificação do método jurisdicional adequado
– jurisdição estatal, mediação, conciliação, arbitragem etc. – e técnicas
de flexibilização processual,
4
proporcionando soluções aos conflitos nas
situações em que a ferramenta disponível for a mais compatível com o li-
tígio. Indubitavelmente, a
marca da consensualidade
5
coincide plenamen-
te com uma das principais características da jurisdição contemporânea,
coadunando-se com tentativa de superação da verticalidade sócio-posi-
cional entre Estado e indivíduo. Em completa dissonância em comparação
aos modelos paradigmáticos liberal e social de processo, em que os sujei-
tos do processo se mantinham completamente afastados, atualmente, o
Estado tem demonstrado uma menor preocupação em
impor
a decisão,
a ordem ou o comando, e mais disposição em
dialogar, participar
e
esti-
mular a composição
entre as partes
6
, inclusive quando também atua na
qualidade de parte.
Essa nova mentalidade, promovida pelo redimensionamento her-
menêutico constitucional irradiou os ramos do direito público, como o
direito administrativo, o direito penal, o direito tributário etc.; e não po-
deria ser diferente com o direito processual civil. Referimo-nos, portanto
a uma mentalidade de
equacionamento das relações de poder
entre juris-
4 Por todos: GAJARDONI, Fernando
. Flexibilização Procedimental: Um Novo Enfoque para o Estudo do Procedimento
em Matéria Processual.
Coleção Atlas de Processo Civil, Coord. Carlos Alberto Carmona, São Paulo: Atlas, 2008.
5 CADIET, Loïc. Propos introductif; “faire lien”. In:
La contractualisation de la production normative.
Sous la direction
de Sandrine Chassagnard-Pinet, David Hiez. Paris: Dalloz, 2008, p.178.
6 Sérgio Cruz Arenhart e Gustavo Osna reconhecem que há uma readequação do diálogo entre jurisdição e
jurisdicionado, e em razão disso, o próprio Estado deverá passar por um realinhamento global das suas funções
institucionais. Na visão dos autores, e com os quais concordamos, a readequação do diálogo repercute no direito
público por meio de uma espécie de “recomposição geométrica” da relação entre administração e administrado,
“fazendo com que a verticalidade estrita (a ordem, o comando ou a imposição) ceda espaço para uma construção
mais horizontal (o diálogo, a participação ou a concertação)”.
Cf
. Os “acordos processuais” no projeto do Novo CPC
– aproximações preliminares. Revista Eletrônica - Tribunal Regional do Trabalho do Paraná, v. 39, 2015. Disponível
em:
http://www.mflip.com.br/pub/escolajudicial/index.jsp?ipg=194778.Acesso em: 20 abr. 2015.