

Revista FONAMEC
- Rio de Janeiro, v.1, n. 1, p. 225 - 252, maio 2017
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Nessa linha de intelecção, percebe-se que o legislador adotou uma
perspectiva equivocada ao estabelecer o critério de aplicação da técnica
da mediação, pois mirou o passado, quando, ao revés, esta é voltada para
o futuro.
23
Não é outra, sublinhe-se, a razão pela qual, ao distinguir as
técnicas de autocomposição, estabeleceu-se no item anterior uma corre-
lação entre a
conciliação - relação instantânea
, de um lado, e a
mediação
- relação de trato continuado com eficácia futura
, de outro.
24
Em síntese: se a relação prévia entre as partes não possui aptidão
para produzir efeitos no futuro, pois estes já se consumaram, não há que se
falar em mediação, pois esta pressupõe uma
realidade coexistencial futura
que não se verifica quando a relação convolou-se em um dado do passado.
3.3 O mediador pode formular propostas de acordo?
Saliente-se, ademais, que os problemas que vão surgir na prática do
foro em decorrência do critério utilizado para diferenciar as técnicas de
conciliação/mediação não seriam tão graves caso não se tivesse cometido
outro erro ainda mais perturbador. Explique-se.
O equívoco anteriormente apontado pode ser contornado à luz
do advérbio
preferencialmente
expresso tanto no § 2º quanto no § 3º do
art. 165. Ante a esqualidez do referencial estabelecido - o qual, conforme
visto, em determinadas hipóteses pode se mostrar tanto subabrangente
quanto sobreabrangente -, adotou-se uma solução de compromisso no
sentido de que: o conciliador atuará preferencialmente nos casos em que
não houver vínculo anterior entre as partes, assim como o mediador atu-
ará preferencialmente nos casos em que houver o vínculo anterior.
O que isso significa? Que se não houver conciliador disponível -
v.
g.
pauta de audiência de conciliação sobrecarregada - poderá atuar um
23 Por todos: “A conciliação tem a sua ocorrência e sua condução motivadas pela identificação de responsabilidades
por evento ocorrido no passado e pela correção presente de suas consequências. La explora o ocorrido, atribui
juízo de valor ao fato e à participação dos atores envolvidos, assim como propõe a criação de soluções reparadoras
e corretivas. A mediação não se volta à culpa pelo ocorrido, mas sim à visão prospectiva: como fazer para evitar
que a motivação do evento passado volte a ser manejada como foi e passe a ser, então, administrada de maneira
que as relações permaneçam preservadas – como atacar as questões sem atacar as pessoas”. (
ALMEIDA, Tânia.
Mediação e conciliação: dois paradigmas distintos, duas práticas diversas. In: CASELLA, Paulo Borba; SOUZA,
Luciane Moessa de (coords.).
Mediação de conflitos. Novo paradigma de acesso à justiça
. Belo Horizonte: Editora
Fórum, 2009, p. 98).
24 “Então, existe diferença no tratamento do conflito entre duas pessoas em contato permanente e entre aquelas
que não se conhecem. Numa batida de carro numa esquina qualquer, por exemplo, o problema, muitas vezes, resol-
ve-se no pagamento de uma indenização; nesta hipótese, a solução do problema resolve o conflito, mas em outras
nas quais as partes necessitem de uma convivência futura, continuada, há necessidade muito mais de pacificação
do que de solução de conflito”. (WATANABE, Kazuo. Modalidade de Mediação.
Série Cadernos do CEJ
n° 22, Brasília:
Conselho da Justiça Federal, 2011, p. 46).