Revista FONAMEC
- Rio de Janeiro, v.1, n. 1, p. 338 - 351, maio 2017
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Caminha ao encontro de uma nova concepção de jurisdição, mais
voltada a uma percepção coexistencial e cooperativa baseada, sobretu-
do, na (re)conciliação e não mais compreendida a partir do monopólio do
Estado, mas percebida como uma entre as várias formas de solucionar as
disputas surgidas na sociedade.
O desgaste da ideia de exclusividade estatal na resolução de confli-
tos é reforçado a cada dia, na medida em que se evidenciam os valores de
métodos compositivos mais consensuais e menos adversariais para a re-
solução dos conflitos. Os argumentos delineados favoravelmente às ferra-
mentas conciliatórias (usualmente extrajudiciais) focam na qualidade da
resolução do conflito, pois as técnicas possibilitam maior envolvimento
das partes no desenvolvimento do processo de dissecamento do proble-
ma proporcionando maior efetividade à solução.
Rechaçando a teoria liberal de que os conflitos seriam essencialmen-
te de direito, exsurge a constatação de que na maioria das vezes, o conflito
teria como fundamento o interesse e não apenas direitos. Carnelutti ado-
tou a expressão
conflito de interesses
para descrever o posicionamento
antagônico entre duas ou mais pessoas sobre o mesmo bem da vida. Para
Niceto Alcala Zamora y Castillo, esta relação entre a pessoa e o bem é qua-
lificada como interesse, que resultará em conflito, quando duas ou mais
pessoas direcionarem seus interesses para um mesmo bem
9
. Ao contrário
da discussão subjacente a um conflito de direito, é a repartição da riqueza
que é posta em jogo em um conflito de interesses, e o dissenso recai sobre
o
quantum
já distribuído ou ao direito resultante da distribuição.
A partir da dimensão social assumida pelo Estado, na segunda
metade do século XIX, desencadeando uma feição mais protetiva, o
valor justiça voltou a despertar interesse em detrimento da limitação
formalista do acesso à justiça e do positivismo extremado que se desen-
volveu no período liberal, exigindo portanto, uma renovação da presta-
ção jurisdicional.
Não obstante servir inadvertidamente como a pretensa cura para a
tormentosa incapacidade de solucionar os conflitos que são submetidos
ao sistema jurisdicional estatal, os métodos
self-solution
devem ser vistos
na verdade, a partir de suas bases constitutivas e valorativas, o que as-
sume expressiva importância quando é observado um caminhar na cena
9 CASTILLO, Niceto Alcalá Zamora y.
Proceso, autocomposición y autodefensa
. 3ed. México: Universidad Nacional
Autónoma de México, 1991, p.17-18.