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Revista FONAMEC

- Rio de Janeiro, v.1, n. 1, p. 384 - 406, maio 2017

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pública (manu militar )...Na Itália dos dois ou três primeiros

séculos de nossa era, a situação era diferente.

A agressão de nosso poderoso vizinho constitui um delito

puramente civil e não implica coerção penal; cabe-nos, pois,

garantir o comparecimento do adversário perante a justiça;

para isso precisamos agarrar esse individuo no meio de seus

homens, arrastá-lo e acorrentá-lo em nossa prisão privada

até o dia do julgamento.

Se não pudermos levá-lo à presen-

ça do juiz, não haverá processo

(litis contestatio). Mas con-

seguimos e, graças à intervenção de um homem poderoso

que nos aceitou como cliente obtivemos justiça: a sentença

diz que o direito está a nosso favor;

nada mais nos resta se-

não executar pessoalmente a sentença, desde que tenha-

mos os meios

.

3

. (grifo nosso)

Assim, para que um homem pretendesse resolver o conflito que

protagonizou, teria, em primeiro lugar, que levar o seu oponente à pre-

sença de um juiz porque, se não o fizesse, o processo sequer se iniciaria.

Para isso, os romanos costumavam manter, como visto acima, prisões pri-

vadas, espaços nos quais acorrentavam os seus oponentes como meio de

garantir seu comparecimento às audiência.

Uma vez realizadas, e ficando decidido que o direito pleiteado era

“bom”, a intervenção do Estado findava aí, cabendo ao vencedor do litígio

executar a sentença às custas de seu próprio esforço.

É de se perguntar: e se ele não dispusesse dos meios necessários?

E se o oponente conseguisse resistir?

Isso perdurou até o século II ou III depois de Cristo. Seja como for,

quando o Império Romano, na parte ocidental do mundo, ruiu e a socie-

dade feudal o sucedeu, mais do que nunca os conflitos passaram a se

resolver à base da força pessoal ou familiar de cada um.

Que o diga Marc Bloch. Segundo narra, vigia, à época, o direito/

dever de vingar de tal modo que, enquanto isso não ocorresse, a família

enlutada sequer poderia enterrar o cadáver do parente morto, cujo corpo

ficava pendurado na porta de casa até que fosse vingado. Feita a vingan-

3 Paul Veyne, O Império Romano,

in

História da Vida Privada, do Império Romano ao ano 1000, Trad. Hildegar Feist,

V.I, São Paulo, Companhia das Letras, 1989, p.166.