Revista FONAMEC
- Rio de Janeiro, v.1, n. 1, p. 384 - 406, maio 2017
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ao conflito, seguindo, para isso, um modelo processual previamente con-
cebido, capaz de produzir decisões racionais, porque previsíveis e calculá-
veis
8
, garantidas, caso necessário, pelo uso da força estatal.
A partir daí, como afirma Philippe Robert, instala-se “
uma lógica
absolutamente diferente de contenção da violência
”
9
, na qual o Estado
usa da força para aplicar um ato de força
, também previamente estipula-
do, contra aquele que se comportou como não deveria, batizado tecnica-
mente pelo nome de sanção.
Assim é que, por exemplo, contra quem afronta a vida alheia se
impõe a sanção da pena; contra quem compra e deixa de pagar se impõe
a sanção da perda de tantos bens bastem à satisfação da dívida; contra
quem não administra a coisa pública de modo honesto e probo se impõe
a sanção do ressarcimento aos cofres públicos, dentre outras.
Em qualquer área que regule – criminal, civil, administrativa etc - o
Estado, através do ordenamento jurídico, imputa sanções. Em consequ-
ência, como ensina Luíz Flávio Gomes, a diferença entre as sanções pe-
nais, civis e administrativas, por exemplo, é “
uma pura questão de opção
legislativa
”
10
. É essa opção que faz de uma conduta crime ou mera infra-
ção administrativa ou civil. Ontologicamente, no entanto, são a mesma
coisa: uma resposta dada pelo Estado à ofensa a um bem juridicamente
tutelado e valioso.
Na área penal, onde os conflitos, a princípio, são
mais
graves e , por
isso, demandam uma resposta
mais
vigorosa, o Estado, ainda de acordo
com Philippe Robert “
se substitui a vítima no papel de ofendido
”
11
, como
se ocorresse um “
confronto entre o simples individuo causador de proble-
ma e o poder público
”
12
.
8 Estas transformações, como ensina Max Weber (
In
Textos selecionados
,
Os Pensadores
, Abril Cultural, Ed. Victor
Civita, 1980, 2ª edição, p. 162), foram, também, exigências do capitalismo nascente. Veja o que ele diz: “Na China
podia acontecer que um homem vendesse a outro: depois de um certo tempo voltasse a ele e reclamasse a devolução,
pela circunstância de haver ficado pobre. Se o comprador, no direito chinês, não atendesse ao mandamento antigo de
ajudar ao próximo, os “espíritos” se indignariam. Desse modo o vendedor empobrecido ocupava a casa novamente,
como arrendatário forçado, sem o pagamento de nenhum aluguel. Com um direito assim estruturado o capitalismo
não podia se desenvolver. O que se fazia necessário era um direito que se pudesse calcular como uma maquina;
neste sentido, entretanto, os pontos de vista mágico-rituais, não desempenham papel algum. A criação de um direito
semelhante foi conseguida quando o Estado Moderno se associou aos juristas para impor sua exigência de domínio”.
9 Sociologia do Crime, trad. Luís Alberto Salton Peretti, Petrópolis, Editora Vozes, 2007, p.27.
10 Acusações Genéricas, Responsabilidade Penal Objetiva e Culpabilidade nos Crimes Contra a Ordem tributária,
in
Revista Brasileira de Ciências Criminais, nº 11, São Paulo, Editora Revista dos Tribunais, 1995, p.251.
11 Op. cit., p. 29.
12 Op. cit., p.28.