Revista FONAMEC
- Rio de Janeiro, v.1, n. 1, p. 111 - 131, maio 2017
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2. NOVOS SISTEMAS DE SOLUÇÃO DE CONFLITOS NO ESTADO DE-
MOCRÁTICO DE DIREITO CONSTITUCIONAL. CAPPELLETTI E SANDER.
A defasagem entre as demandas e as possibilidades do Estado em
atendê-las é uma preocupação antiga por parte da doutrina que entende o
processo como instrumento de realização do direito material
14
e que, por-
tanto, deve se mostrar cada vez mais rente aos conflitos da sociedade
15
.
Calamandrei, ainda em meados do século passado, assinalava que
“[esta] situação determina que se produza, com maior facilidade que em
outras matérias, uma falta de harmonia entre as normas e as necessida-
des da prática, pois as formas criadas por um certo momento são inade-
quadas para outro, e, além do mais, as classes forenses são eminente-
mente conservadoras em relação ao tecnicismo processual”.
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Chiovenda, em seus
Principii
, advertia que “entre as instituições
jurídicas, o processo é o organismo mais delicado: por ser um meio de
atribuir os bens da vida mediante a atuação da lei, ele tem uma posi-
ção central entre os institutos do direito privado e do direito público; e
sendo uma relação muito complexa, nela ressaltam tanto o aspecto jurí-
dico como o político e o social, de tal maneira que as mais leves mudan-
ças nas condições morais, políticas e sociais da época se refletem no seu
funcionamento.”
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Essa discrepância entre o processo – como instrumento de acesso
à justiça - e sua capacidade de tornar efetivo o direito material foi apon-
tada ainda em meados do século passado, e coube a Cappelletti, a Garth
e a Frank Sander os primeiros contornos que introduziram as modifica-
ções que permitiram algumas adaptações do Judiciário às necessidades
da pós-modernidade em advento.
Como visto, a evolução social demarcada desde o liberalismo deter-
minava uma confluência inédita de processos ao judiciário. A instrumen-
talização das garantias constitucionais (Estado de Direito Constitucional),
a tendência à massificação das relações e a crescente complexidade das
demandas, de par com a atuação positiva dos juízes, acabaram por esti-
mular ainda mais a busca por soluções nos Tribunais.
14 Rosemberg, Leo. Da Jurisdição ao Processo. São Paulo. Impactus Editora: 2005, p. 11.
15 Como leciona Ada Grinover, a instrumentalidade finalística do processo é a atuação do direito material, sendo por
isto mesmo instrumental em relação a este.
op.cit.
, p. 13.
16 Calamandrei, Piero.
Processo e Democracia
, São Paulo. Ed. Livraria do Advogado: 2017, p. 32.
17 Chiovenda, Giuseppe.
Pirincipii di Diritto Processual Civile.
3ª ed., p. 131.