A Escola da Magistratura do Estado do Rio de Janeiro encerrou nessa quarta-feira (08) o “Colóquio internacional sobre cuidado da criança e do adolescente na família extensa”, reunião promovida pelo Fórum Permanente da Criança, do Adolescente e da Justiça Terapêutica.
O encontro, que marca as comemorações do centenário do primeiro juizado da infância do Brasil, é elaborado em parceria com a Associação Brasileira Terra dos Homens (ABTH), a Coordenadoria Judiciária de Articulação das Varas da Infância e Juventude e Idoso (CEVIJ) e o Movimento Nacional Pró-Convivência Familiar e Comunitária.
O evento aconteceu presencialmente no Auditório Desembargador Paulo Roberto Leite Ventura, com transmissão via plataforma Zoom. Houve tradução simultânea do espanhol para português, do inglês para o português e para a Língua Brasileira de Sinais (Libras).
Exibição de Filme
Na abertura do último dia do encontro, ocorreu a exibição do documentário “Encontrando o caminho de casa”. Após o filme, houve o depoimento de Cristina da Cruz Nascimento: “Em 1988, eu era usuária do crack. Eu não vivia mais e sabia que uma hora ia morrer. Um dia tentei o suicídio, porque pensava que não merecia viver. Tinha perdido minha mãe, minhas duas filhas estavam no abrigo e me vi sozinha. Mas eu não morri e em nenhum momento abandonei minhas duas filhas, todo fim de semana eu ia visitá-las no abrigo. A assistente social da época me falava que eu não tinha condições e precisava entregar minhas filhas para a adoção, mas não me entreguei. Depois do meu acidente, uma outra assistente social me perguntou por que eu tinha feito o que fiz. Respondi que tinha perdido a vontade de viver por terem tirado minhas filhas de mim. Ela, então, me perguntou se eu mudaria de vida se elas voltassem para mim. A partir dali prometi para mim mesma que eu mudaria de vida, nunca mais usaria droga, e elas voltaram para mim. Agradeço também a ACER, que quando eu mais precisei estava do meu lado, me ajudando financeiramente, com a preocupação de nos acolher, conversar, orientar com médico, psicólogo e assistente social. Ter onde ser acolhido é muito importante”.
O secretário geral da Associação de Apoio à Criança em Risco (ACER BRASIL) Jonathan Hannay pontuou: “Estamos em um simpósio. Seria fácil olhar para essa história e ver a capacidade incrível, a capacidade interna de todas elas e ficar nisso. Mas o mais importante é ouvirmos a história contada e entender. Não é tão simples mudar, apesar do desejo estar lá”.
As netas de Cristina, Karina, Karoline e Kettelyn Vitoria também compuseram a mesa.
Palestras Magnas
A psicóloga Meredith Kiraly, professora da Universidade de Melbourne, destacou: “Os benefícios do cuidado de parentesco já foram identificados por pesquisas britânicas e são muito claros: as colocações são mais estáveis do que em lares adotivos; contato mais frequente com pais, irmãos e família extensa; é, pelo menos, tão seguro quanto um orfanato; em geral, as crianças se saem tão bem quanto em lares adotivos; e as crianças geralmente parecem estar felizes com os cuidados de parentesco, vendo-os como mais naturais”.
“Agradecemos muitíssimo e queremos que tenham presente sempre o governo colombiano para podermos construir laços sociais com o Brasil. Nos consideramos países irmãos, que estão em um processo de transformação em tudo que implica a garantia dos direitos. Quero contar das apostas estratégicas que estamos assumindo como país para tratar de um sistema de cuidado. A primeira coisa, muito importante para a Colômbia, foi a criação do Ministério da Igualdade e Equidade. Antes, não tínhamos um exercício direto com esses temas, todos estavam pensados em uma lógica muito mais subsidiária do que de construção do tecido social. A criação desse ministério é uma das maiores apostas para a transformação do Estado, pensando nas comunidades mais esquecidas e em equilibrar as condições para que todos tenham oportunidades. É esse ministério que abre todo um setor e, dentro dele, o Instituto Colombiano de Bem-Estar Familiar, que tem dois cenários de atuação: prestar serviços para garantir direitos e o Sistema Nacional de Bem-Estar Familiar, que se articula com o Sistema Nacional de Cuidado”, salientou Astrid Cáceres, diretora-geral do Instituto Colombiano de Bem-Estar Familiar (ICBF).
Karla Pinder, diretora do projeto Save the Children, Marcelo Giacoia, juiz de Responsabilidade Penal Juvenil de Mercedes, Buenos Aires, e Haidy Isabel Duque Cuesta, integrante do ICBF, também estiveram presentes na mesa. A mediação foi conduzida pela psicóloga Anna Paula Uziel, professora do Instituto de Psicologia da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (Uerj).
Mesa 5 – Diálogo sóciojurídico no Brasil - Grupo intersetorial nacional sobre cuidados na família extensa
O juiz do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo (TJSP) Eduardo Rezende de Melo afirmou: “Nós precisamos reconhecer que o acolhimento familiar ou institucional, embora seja uma medida importante e ainda que seja rápido, apenas de uma noite, pode ser traumático. Nós temos trabalhado e avançado com a discussão sobre violência institucional em relação às crianças vítimas, e acho que é fundamental que avancemos também nessa discussão em relação aos acolhimentos”.
“Nós precisamos de um sistema de Justiça que seja adaptável e amigável às necessidades das famílias e, sobretudo, das crianças e adolescentes. Não é mais possível que em uma situação de guarda sem conflito, que poderia ser uma guarda compartilhada entre a família natural e a extensa, o sistema de Justiça demore dois anos para responder isso para a família”, declarou o promotor de justiça do Ministério Público do Estado de Santa Catarina (MP-SC) João Luiz de Carvalho Botega, membro do Conselho Nacional do Ministério Público (CNMP).
A coordenadora das defensorias públicas especializadas dos Direitos das Crianças e Adolescentes da Bahia Gisele Aguiar, membra do Conselho Nacional das Defensoras e Defensores Públicos-Gerais (CONDEGE), reforçou: “Hoje, como não há um regramento específico das medidas de acolhimento, as falas daquela criança e da família são apenas um relatório e isso é o que nós mais combatemos”.
Também compuseram a mesa Ana Angélica Campelo, representante da Secretaria Nacional de Assistência Social do Ministério do Desenvolvimento e Assistência Social, Família e Combate à Fome (MDS), a diretora-geral da Providens Fernanda Flaviana Martins, secretária-executiva do Movimento Nacional Pró-Convivência Familiar e Comunitária (MNPCFC), e Isaías de Araújo, representando os conselheiros tutelares. Cláudia Cabral, diretora executiva da ABTH, ficou a cargo da mediação.
Mesa 6 - Apresentação dos trabalhos dos grupos e Moção Final
Na última mesa do encontro ocorreram as apresentações dos trabalhos desenvolvidos pelos subgrupos temáticos. O promotor de Justiça do estado do Tocantins Sidney Fiori Júnior, coordenador do Centro de Apoio Operacional às Promotorias da Infância, Juventude e Educação (CAOPIJE), representou o “Grupo 1 – Leis, normativas, benefícios e impactos orçamentários”. O “Grupo 2 - Diagnóstico inicial de avaliação da situação familiar - direcionamento para programas/serviços em consonância com o melhor interesse da criança” foi apresentado por Maria de Jesus Bonfim de Carvalho, integrante da Secretaria Nacional da Política de Cuidados e Família (SNCF). A doutora Edinalva Severo foi a representante do “Grupo 3 – Programa/serviço especial de cuidados na família extensa”.
O presidente do Fórum, juiz Sérgio Luiz Ribeiro de Souza, titular da 4ª Vara da Infância, da Juventude e do Idoso da Comarca da Capital do Rio de Janeiro, promoveu a moderação. A coordenação foi feita pela defensora pública Simone Moreira de Souza, titular da 2ª Defensoria da 1ª Vara da Infância, Juventude e Idoso da Defensoria Pública do Estado do Rio de Janeiro (DPRJ), que salientou: “Esse colóquio trouxe muitas reflexões, muitos debates, a importância do intercâmbio de experiências, opiniões e conceitos. Como representatividade dessa democracia, a intersetorialidade aqui está muito bem representada. Construímos um documento, que se aprovado pela plenária, será apresentado ao Conselho Nacional dos Direitos da Criança e do Adolescente (Conanda), ao Conselho Nacional de Saúde (CNS) e ao Governo Federal, através dos seus ministérios que compõem o sistema de garantia de direitos. Isso é só o início de um trabalho, no qual a cada biênio teremos uma reavaliação a respeito de tudo que foi aqui discutido e do quanto conseguimos avançar. Temos um grande dever de casa: multiplicar tudo que foi discutido”.
Cláudia Cabral e Eliana Olinda Alves, psicóloga da CEVIJ, também compuseram a mesa.
No encerramento do “Colóquio internacional sobre cuidado da criança e do adolescente na família extensa” houve a apresentação da moção final do evento realizada pela defensora pública Simone Moreira de Souza. Após a leitura da moção, ocorreu um coquetel, com lançamento de publicações do evento.
Assista
Para assistir na íntegra, acesse: https://www.youtube.com/watch?v=zSK9CUdfhhc
Fotos: Jenifer Santos e Maicon Souza
08 de novembro de 2023
Departamento de Comunicação Institucional (DECOM)