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EMERJ realiza encontro “O PL 1.904/2024: violência institucional aos direitos reprodutivos das meninas e mulheres”

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A Escola da Magistratura do Estado do Rio de Janeiro (EMERJ) realizou nesta segunda-feira (24) o encontro “O PL 1.904/2024: violência institucional aos direitos reprodutivos das meninas e mulheres”.

A reunião aconteceu presencialmente no Auditório Desembargador Paulo Roberto Leite Ventura, com transmissão via plataforma Zoom e tradução simultânea para a Língua Brasileira de Sinais (Libras).

Abertura

A presidente do Fórum Permanente de Violência Doméstica, Familiar e de Gênero, desembargadora Adriana Ramos de Mello, coordenadora do o Núcleo de Pesquisa em Gênero, Raça e Etnia (NUPEGRE) do Observatório Bryant Garth da EMERJ, destacou em sua fala de abertura: “Esse é um evento que não é de muita felicidade, mas muito importante para debatermos. Transmito aqui também a importância desse evento para nosso diretor-geral, desembargador Marco Aurélio Bezerra de Melo. Ele me procurou para fazermos esse evento para discutirmos esse projeto de lei. Estamos felizes da Escola da Magistratura trazer esse debate para o campo acadêmico, para a discussão científica”.  

“Esse é um projeto de lei recente, que nos preocupa demais. Entendemos que seria um retrocesso aos direitos das meninas e mulheres, sobretudo meninas adolescentes que engravidam, um retrocesso porque prevê o prazo gestacional de 22 semanas. Entendemos que esse projeto de lei, além de inconstitucional, é inconvencional, porque além de violar a Constituição Federal, sobretudo os princípios da igualdade de gênero, que está no artigo quinto, inciso primeiro, o direito à saúde, os direitos reprodutivos, a autonomia da mulher, ou seja, viola vários direitos”, prosseguiu a desembargadora Adriana Ramos de Mello.

A desembargadora Adriana Ramos de Mello concluiu: “Esse projeto de lei prejudica, sobretudo, meninas e mulheres pobres, que não tem assistência à saúde garantida de forma igualitária para todas as mulheres. Ainda vivemos em um país extremamente desigual social e estruturalmente. Esse projeto de lei traz esse contexto de violação aos direitos sexuais e reprodutivos, dentre outros princípios estabelecidos na nossa Constituição Federal”.

“Eu não podia deixar de trazer algumas palavras. Primeiro, a palavra do desembargador Marco Aurélio de parabéns por esse evento. É muito importante nesse momento discutirmos um bem jurídico tão relevante que é exatamente esse dos direitos reprodutivos. O Direito, muitas vezes, toma medidas, decisões ou normatiza coisas sem conhecer exatamente qual é o bem jurídico, ou seja, aquele bem da vida que estamos cuidando e tratando. É importante que uma discussão como essa seja exatamente uma discussão multidisciplinar, para trazer a contribuição daquilo que nós, profissionais do Direito, podemos decidir em situações como essa e, muito mais do que isso, o que pode o legislador. Será que o legislador pode tudo? Pode tornar qualquer coisa letra da lei? Todas essas questões precisam ser debatidas em um foro como esse, com a oportunidade de termos núcleos de pesquisa onde vamos verificar os fatos da vida para que se possa nortear não só a decisão do juiz, mas principalmente a elaboração de normas jurídicas que estejam de acordo com a situação e atendam a questão tão relevante como essa”, afirmou o vice-presidente do Conselho Consultivo da EMERJ, desembargador Luís Cláudio Braga Dell’Orto, magistrado supervisor de Tecnologia da Informação da EMERJ.

O presidente do Fórum Permanente de Direitos Humanos, desembargador Caetano Ernesto da Fonseca Costa, 1º vice-presidente do Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro (TJRJ) e mestre em Cidadania e Direitos Humanos: Ética e Política pela Universidade de Barcelona, pontuou: “Gostaria apenas de elogiar a iniciativa da Escola da Magistratura e, evidentemente, manifestar a minha solidariedade com tudo que está sendo discutido aqui hoje”.

Palestrantes

O médico Olímpio Barbosa de Moraes Filho, professor adjunto de Obstetrícia e Ginecologia da Universidade de Pernambuco, diretor-médico do Centro Universitário Integrado de Saúde Amaury de Medeiros da UPE (CISAM-UPE) e doutor em Tocoginecologia pela Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), declarou: “Acho que o importante é entender a dificuldade nesse assunto, na saúde das mulheres na prática, de quem trabalha na ponta. No Brasil, tem seis estados que praticamente não tem o serviço de abortamento previsto em lei. Temos 101 serviços registrados, mas na prática, nos último cinco anos, apenas 60 fizeram. Alguns municípios tem um número maior de casos em um ano e em outro esses números desaparecem. O que parece é que como o abortamento previsto em lei é um evento que não necessita de tecnologia, os hospitais e municípios dependem muito da gestão local, quer dizer, trocou o diretor médico ou o secretário de saúde é contra ele passa a proibir. Então, o serviço não funciona”. 

“Essa discussão começou com a resolução do CFM, que tornou antiética a assistolia fetal. O ministro do STF Alexandre de Moraes cassou e suspendeu. Já que a alegação era que não havia legislação, negociaram esse projeto de lei que proíbe. Mas o nascedouro foi no CFM. Por quê? Porque em 2020, aconteceu um caso midiático de uma menina do Espírito Santo estuprada e foi iniciada uma ação para que não houvesse acesso ao abortamento, porque no Espírito Santo o serviço que realiza o procedimento tem um limite técnico de 22 semanas. Ela foi encaminhada para Recife e teve até tentativa de invasão na maternidade em que sou diretor. Foi terrível, com a menina sendo chamada até de assassina. Foi a partir desse caso que apareceu para a maioria das pessoas que existia a possibilidade do abortamento depois de 22 semanas. Acho que eles acreditavam que enclausurando uma menina até esse período eles evitariam o direito ao abortamento. Então, foi esse caso que fez as pessoas perceberam que não existe esse marco, que é baseado em uma norma técnica do Ministério da Saúde, de 2012, que colocava o período de 22 semanas, mas uma norma técnica não proíbe é um passo a passo. A Federação Internacional de Ginecologia e Obstetrícia (Figo) fez até uma nota contra o CFM, isso é algo raro. A Figo fez uma recomendação muito forte, dizendo que o Conselho Federal de Medicina está se portando de forma antiética”, continuou o diretor-médico do CISAM-UPE.

O médico Olímpio Barbosa de Moraes Filho finalizou: “Não existe abortamento de nove meses. Os casos que existem de 27, 28, 30 semanas, são casos em que houve ações de forças para bloquear o acesso ao serviço, porque existe uma ação deliberada de fechar as portas para que essas pessoas não tenham acesso. Todos trabalhamos para que ninguém ultrapasse as 22 semanas, mas essas barreiras colocadas, as vezes até a própria família, com portas fechadas sistematicamente, impedem essa realidade”.

“Nossas universidades, especificamente as faculdades de Direito espalhadas pelo Brasil, não tem formado advogados e profissionais da área do Direito com o preparo que entendemos como absolutamente necessário para que eles possam agir no sentido da justiça. Por isso, o trabalho da EMERJ é fenomenal, exemplar e modelar. Nossas faculdades ainda estão muito carentes de uma formação que respeite a ética humanista para homens e mulheres. Ainda grande parte dos profissionais do Direito, profissionais dentro do sistema de justiça, tem a ignorância, o desconhecimento de que o Direito Internacional e Interamericano de Proteção aos Direitos Humanos conformam e se integram no ordenamento jurídico brasileiro, artigo segundo e terceiro da nossa Constituição Federal de 1988. Essa ignorância é que traz muito mais dificuldade quando temas delicados como o discutido hoje se apresentam”, disse a advogada Sílvia Pimentel, cofundadora do Comitê Latino-Americano e do Caribe para Defesa dos Direitos da Mulher (CLADEM) e integrante do Comitê para Eliminação da Discriminação contra a Mulher da Organização das Nações Unidas (CEDAW/ONU) de 2005 a 2016 e presidente do CEDAW em 2011 e 2012.

A advogada Sílvia Pimentel encerrou: “Esse PL trata-se de um grande equívoco. Toda gravidez indesejada, em especial aquela advinda do estupro, ocorre, salvo exceções, em meninas e mulheres vulnerabilizadas pela pobreza e a consequente falta de condições para poder decidir e conseguir alcançar a interrupção da gravidez dentro dos prazos saudáveis e dignos. Equívoco porque, toda gravidez indesejada causada por um estupro, afeta crianças meninas dentro de suas casas por pais, padrastos, avós, tios, irmãos e vizinhos. Pergunto eu: seria então o Direito Penal o melhor instrumento para enfrentar tal barbárie? Ou cabe ao Estado Democrático de Direito privilegiar políticas públicas deixando o Direito Penal com o que lhe é próprio, isto é, ser utilizada como última racio? O PL utiliza-se do Direito Penal, que deveria ser o último recurso na resolução de conflitos sociais, para escancarar um pensamento fundamentalista e misógino que não considera a realidade concreta e as dificuldades dessas mulheres e meninas estupradas”.

“Esse projeto é um monstrengo jurídico, uma violência por si só. Gostaria de chamar atenção para algo que não tem sido falado. Colocaram no texto um ovo de serpente. Todos sabemos perfeitamente que o artigo 128 do Código Penal dispõe sobre excludentes de ilicitude, ou seja, o Código Penal criminalizou o abortamento em três hipóteses e depois em duas hipóteses legais ele descriminaliza o aborto. O aborto legal nessas duas hipóteses é uma referência a descriminalização, portanto, quem pratica o abortamento de acordo com essas hipóteses não pratica crime. Porque estou dizendo isso? Lembram-se de uma norma feita pelo Ministério da Saúde no passado quando se afirmava que todo aborto é criminoso, mesmo o aborto legal? Isso era uma falácia. Nós fomos a campo contra isso, porque era um absurdo. Agora, nesse projeto está escrito excludentes de punibilidade, ou seja, se volta para essa tese, que é a imposição de um conceito neurótico. No fundo, quer se dizer que a mulher que, eventualmente, pratique o abortamento dentro das hipóteses legais é uma criminosa, apenas não sofrerá pena. Portanto, aqueles que conhecem minimamente o Direito Penal tem que se levantar contra isso. Temos que insistir nisso. Apenas por esse dispositivo o projeto já deveria ser rejeitado. É uma armadilha, uma excrecência epistemológica, um absurdo dogmático”, reforçou o desembargador do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo (TJSP) José Henrique Rodrigues Torres, membro do Grupo de Estudos sobre Aborto (GEA), da Rede Global Doctors For Choice/BR, da Católicas pelo Direito de Decidir (CDD) e da Plataforma Brasileira para a Política de Drogas (PBPD) e do Instituto Nacional de Pesquisa e Promoção dos Direitos Humanos.

O desembargador do TJSP José Henrique Rodrigues Torres expôs em sequência: “Também é importante insistirmos que esse projeto afronta todo o sistema de garantia de direitos humanos. Há os aspectos legais, sociais, médicos, mas sobretudo, sobre o ponto de vista jurídico, no âmbito da inconvencionalidade, ele viola frontalmente todo o sistema de proteção dos direitos humanos. O Legislativo está proibido de fazer leis que afrontem os direitos humanos. O Executivo tem a obrigação de criar políticas públicas para acolher os direitos humanos e repelir o contrário. E esse sistema de direitos humanos é composto por normas jurídicas, de regras e princípios. Esse é o bê-á-bá dos direitos humanos, mas temos que voltar a isso. Mais, nós estamos submetidos também, soberanamente, porque assim o fizemos ao assinar os tratados a jurisprudência da Corte Interamericana de Direitos Humanos. Esse monstrengo jurídico que é esse PL afronta, confronta e viola todas essas normas, regras e princípios. Existe um outro ponto extremamente importante. O sistema de proteção e garantia dos direitos humanos tem afirmado também, reiterada e insistentemente, em vários documentos, tratados e decisões que a criminalização do aborto é incompatível com a garantia da saúde, da dignidade e da vida das mulheres. Portanto, quando se pensa em criminalizar o aborto, manter a criminalização do aborto, estamos contrariando o que sistema de proteção dos direitos humanos está afirmando. O Brasil tem assinado compromissos internacionais dizendo que vai descriminalizar o aborto. 1994, 1995, 2006 e vários outros documentos em que o Brasil tem assumido o compromisso de caminhar pelo menos no sentido da descriminalização. Portanto, qualquer movimento no sentido contrário contraria a principiologia e o sistema de proteção dos direitos humanos. Com esse PL, então, se quer exatamente contrariar o compromisso assumido caminhando no sentido contrário, ampliando a criminalização e violando o sistema de direitos humanos”.

“É um projeto sem nada de ético, hediondo e nefasto. Para além de tudo isso, é inconstitucional e inconvencional e diante de um dispositivo desses qual nosso dever constitucional enquanto juízes, desembargadores, magistrados diante de algo que viole os direitos humanos? Lembrem-se, a Corte Interamericana de Direitos Humanos, em 2006, na decisão do caso Arellano e outros versus Chile afirmou que é obrigação e dever de juízes e juízas a vigência e a validade de leis e normas que contrariam os direitos humanos e a jurisprudência da corte. O CNJ baixou recentemente uma resolução dizendo para magistrados aplicarem os tratados de direitos humanos, as convenções e a jurisprudência da corte, fazendo o controle de convencionalidade. O Código de Ética da Magistratura afirma expressamente que é dever ético dos juízes e juízas garantir a máxima garantia dos direitos humanos. Está expresso. Portanto, é dever, obrigação dos magistrados, em caso de uma catástrofe da aprovação desse projeto, dizer não a validade e declará-lo inconstitucional e inconvencional e garantir os direitos das mulheres e meninas desse país”, concluiu o desembargador do TJSP José Henrique Rodrigues Torres.

A advogada Leila Linhares Barsted, membra do Fórum Permanente de Violência Doméstica, Familiar e de Gênero, coordenadora executiva da ONG Cidadania, Estudo, Pesquisa, Informação e Ação (CEPIA), membra do Comitê de Peritas do Mecanismo de Seguimento da Convenção de Belém do Pará da Organização dos Estados Americanos (MESECVI/OEA) e do Consórcio Lei Maria da Penha, salientou: “Gostaria de falar sobre o constrangimento do princípio da laicidade do Estado. Essas tratativas, que hoje vemos no PL 1904/2024, estão sempre presentes na história do Brasil, são tratativas que dizem respeito a abolição do Estado laico, mas que também dizem respeito, particularmente, ao controle dos corpos das mulheres, da emancipação das mulheres. Trazer para o debate a questão desse projeto é trazer para o debate a questão do constrangimento da laicidade do Estado no Brasil, do constrangimento da democracia, da tomada de poder contínua de grupos fundamentalistas sobre o Estado, o Legislativo, o Executivo, o Judiciário. Vemos esse movimento de trazer para dentro do Estado esses padrões de controle, ou de arrasamento, da democracia e da diminuição do exercício de direitos das mulheres”.

“Para alcançarmos direitos humanos, sexuais e reprodutivos, precisamos ter acessos a outros direitos. Se não ampliarmos o olhar e o debate para a justiça social não vamos garantir direitos sexuais e reprodutivos. É uma ilusão, uma falácia, pensarmos que estamos falando das mesmas pessoas, de direitos iguais, em um país totalmente desigual. Precisamos ter o recorte racial, muito se fala dos impactos desse PL, desse retrocesso no país, de maneira geral para meninas e mulheres. Mas quem são essas meninas e mulheres? É importante dizermos quem são as maiores impactadas, criminalizadas, que também são as que mais morrem e sofrem violência no país. A ausência desse recorte também é uma prática do racismo no nosso país. É impossível debatermos sem dizer que meninas e mulheres negras são as mais impactadas por esse projeto. Precisamos ampliar esse debate, pautado nos direitos humanos, na autonomia das mulheres e na necessidade de ter dignidade de vida, de meninas e mulheres negras também, desde o direito a gestar, maternar, parir, abortar, acessar serviços livres de violência e do racismo, compreendendo também que a maternidade compulsória é um ponto muito problemático e questionável no nosso país, que não está pronto para mulheres que dizem que não querem parir, gestar ou ser mães, e que também não está pronto para abraçar casais lésbicos, por exemplo, que querem ser mães. Temos muito ainda a caminhar. Esse é um projeto necropolítico. Gravidez forçada é tortura, estuprador não é pai e criança não é mãe”, palestrou a enfermeira obstétrica Mariane Marçal, assistente de Coordenação de Projetos e Incidência Política da ONG Criola, sanitarista e mestra em Relações Étnico-Raciais pelo Centro Federal de Educação Tecnológica do Rio de Janeiro (CEFET-Rio).

Ana Míria dos Santos Carvalho Carinhanha, secretária executiva adjunta do Ministério da Igualdade Racial, doutora em Sociologia e Direito pela Universidade Federal Fluminense (UFF) e em Direito pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), dissertou: “É importante nos basearmos inclusive na Consulta Pública feita depois dessa manifestação do Congresso e dizer que 88% das pessoas que votaram são completamente contrárias a esse projeto. Então, se pensamos na legitimação pública de algo que está sendo feito de maneira arbitrária é importante dizer que a população está contra esse projeto. Esse é um passo importante para essa caminhada de dar publicidade e trabalhar de maneira democrática com um tema tão espinhoso na nossa sociedade. Espinhoso porque ele faz parte de algo que está no legado de algo que se discute como um tema moral, mas que é reflexo de um discurso que vem sendo travado, sobretudo da ausência de pessoas nos espaços de poder para fazer esse tipo de discussão, de não permitir que debatamos os temas de maneira democrática”.

“Quando retiramos uma questão como essa, referente ao aborto, porque estamos falando de aborto, do âmbito penal e passamos a tratar a partir do âmbito da saúde pública e do âmbito moral, ético, é preciso que entendamos o debate sobre a vulnerabilidade social. Porque o aborto existe, ele é um fato social e pode ser abordado a partir de múltiplas dimensões e essas abordagens trazem vieses que não podemos ignorar. É imperito trabalhar um tema como esse sem abordar as vulnerabilidades sociais como as questões das mulheres pobres, negras e mais jovens serem as mais vulnerabilizadas, como o fato de mais de 80% das mulheres menores de idades vítimas dessas violências são vítimas de pessoas próximas a elas. Portanto, temos uma série de evidências que nos colocam como é irresponsável tratar dessa temática na esfera penal”, enfatizou Ana Míria dos Santos Carvalho Carinhanha.

Maria Helena Barros de Oliveira, coordenadora do Mestrado Profissional em Direitos Humanos, Justiça e Saúde em parceria da EMERJ com a Fiocruz, vice-coordenadora do NUPEGRE, chefe do Departamento de Direitos Humanos, Saúde e Diversidade Cultural da Fiocruz (DIHS/Fiocruz) e doutora em Saúde Pública pela Fiocruz, encerrou: “Hoje vivemos uma tarde histórica. Todas as falas convergiram para a defesa da vida. Não falamos de outra coisa a não ser sobre a defesa da vida. E é dessa forma que devemos continuar essa luta. Esse projeto vai persistir, ele vai continuar e vão tentar fazer com que ele seja lei. E, ainda que essa tragédia aconteça, teremos que continuar lutando. Acho que é da vida que estamos falando. É da vida de meninas que têm o direito de continuarem sendo meninas, sendo respeitadas e de ter o direito de sonhar, mesmo em uma situação tão desigual como essa que a sociedade brasileira nos coloca. Estamos falando de todas as meninas e mulheres, mas em especial as meninas negras, pobres e de periferia. Não podemos igualar o que não é igual”.

Encerramento

A professora Silvia Pimentel manifestou: “Nossa tarde foi realmente muito bonita. Gostaria de salientar também que tivemos um encontro muito interdisciplinar, respeitando a questão de gênero, de raça, das nativas indígenas. Parabéns a EMERJ por tudo que está fazendo, muito especialmente pela tarde que nos proporcionou e pelo rico conhecimento que foi aqui dialogado”.

“Esse PL tem vários princípios de violação à nossa Constituição Federal, dentre eles, o da dignidade da pessoa humana, do planejamento familiar, da violação a autonomia da mulher, da violação ao direito a integridade física e psíquica, da violação aos direitos sexuais e reprodutivos, dos princípios da igualdade de gênero e da segurança, dentre outros vários. Acho que muito mais do que isso, todo esse debate que a sociedade civil está promovendo é super importante. A luta dos direitos das mulheres vem da rua, do chão de fábrica. Nenhum movimento, nenhum direito das mulheres foi fácil de se obter. Foi sempre com muita luta, com muita contenda. Espero que essa luta feminista e essa luta por direitos vá para o Congresso de uma forma bem mais intensa. Como eles estão falando, precisamos também falar. Quem pode falar por essas meninas que estão sendo violadas e estupradas somos nós que estamos aqui, não podemos nos calar nesse momento. Precisamos trazer esse debate para o Congresso para evitar que isso chegue ao Judiciário. O Judiciário é o último bastião e o Direito Penal não solucionará esse problema. Esse é um problema do Executivo, que deve criar centro de atendimentos especializados a meninas e mulheres de todas as idades, trabalhar a questão dos direitos sexuais, informação, isso é sim questão de politicas públicas do Executivo. Claro, se houver violação deve ir para o Poder Judiciário, mas o Executivo e o Legislativo devem fazer o seu papel”, evidenciou a desembargadora Adriana Ramos de Mello.

A desembargadora Adriana Ramos de Mello encerrou: “Encerrando, eu queria falar sobre a participação política das mulheres. No Congresso brasileiro as mulheres são subrepresentadas. Nós não estamos representadas no Legislativo, que tem apenas entre 15% e 18% de mulheres. É importante que vejamos quem são as candidatas, mas para ter mulheres é preciso que elas tenham dinheiro para suas campanhas, que não haja fraude as cotas, que o dinheiro do fundo partidário também vá para as mulheres. É toda uma engrenagem que precisa funcionar, que ainda é uma pauta pendente a nível nacional. No Brasil as mulheres estão subrepresentadas no Legislativo, no Executivo e no Judiciário. Precisamos eleger mais mulheres, mas elas precisam ter o direito de efetivamente concorrer em condições de igualdade, em paridade, com os homens, até para evitarmos que uma legislação dessa apareça em um Congresso eminentemente masculino, heteronormativo e branco”.

Participação Especial

Apresentação musical realizada durante o encerramento do evento.

Ao final do encontro, a secretária-geral da EMERJ Gabriela Rafael da Silva Carneiro acompanhada do chefe do Serviço de Design Gráfico (SEDEG) Ébano Machel do Rosário Assis brindaram a todos os presentes com uma performance musical.

Coordenação do evento

A coordenação ficou a cargo da desembargadora Adriana Ramos de Mello e da advogada Silvia Pimentel.

Assista

Para assistir na íntegra, acesse: https://www.youtube.com/watch?v=EEeB0TqnlKY

 

Fotos: Jenifer Santos

24 de junho de 2024

Departamento de Comunicação Institucional (DECOM)