Nesta segunda-feira (16), o Fórum Permanente de Direito da Cidade da Escola da Magistratura do Estado do Rio de Janeiro (EMERJ), em parceria com o Núcleo Permanente de Métodos Consensuais de Solução de Conflitos (NUPEMEC) e a Escola de Mediação (Emedi), ambos do Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro (TJRJ); a Rede de Pesquisa em Direito da Cidade (RPDC) e o Programa de Pós-Graduação em Direito da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (PPGD-Uerj), realizou o encontro A Função Social dos Bens Públicos Urbanos: Para Além da Vedação Constitucional do Usucapião.
O encontro aconteceu presencialmente no Auditório Desembargador Joaquim Antônio de Vizeu Penalva Santos. Houve transmissão via plataforma Zoom, com tradução simultânea para a Língua Brasileira de Sinais (Libras).
Abertura
O presidente do fórum, professor e pesquisador do PPGD-Uerj, desembargador Marcos Alcino de Azevedo Torres, realizou a abertura do evento.
Palestrantes
O membro do fórum, professor permanente do Mestrado e Doutorado em Cidade da Uerj e procurador do Estado do Rio de Janeiro, Mauricio Jorge Pereira da Mota, salientou: "É um prazer estar aqui na EMERJ novamente, em mais um evento do nosso Fórum Permanente de Direito da Cidade, para tratar de um tema tão importante. Por que é importante trabalhar a ideia de função social da propriedade? Qual é a lógica, a data, a ideia de uma função social da propriedade? Precisamos sempre refletir sobre o fundamento do chamado Direito Natural Clássico, como os gregos concebiam a ideia de Direito e como isso influenciou uma série de institutos jurídicos que foram organizados posteriormente, inclusive a própria ideia de função social da propriedade. Para os gregos, o Direito é uma proporção do justo, ele está na natureza. As sociedades são naturais, organizadas para estabelecer uma determinada ordem, que eles chamavam de ordem natural ou natureza das coisas. Existe, portanto, uma natureza ordenada do mundo, e o Direito faz parte dessa natureza."
O presidente do fórum, desembargador Marcos Alcino de Azevedo Torres, relatou: "O Código Civil de 2002 adotou, quanto à posse, o conceito de Ihering, segundo o qual se considera possuidor todo aquele que tem, de fato, o exercício, pleno ou não, de algum dos poderes inerentes à propriedade, distinguindo-se da detenção, por sua vez, pela circunstância de a lei, por determinação expressa, excluir a proteção possessória, atendendo às circunstâncias peculiares da causa detentionis, do motivo que provocou a situação material. Com efeito, para Ihering, toda situação material de poder exercido conscientemente sobre uma coisa constitui posse, salvo se a lei, por motivo de ordem prática, determinar o contrário."
A membra do fórum, professora de Direito da Uerj e procuradora do município do Rio de Janeiro, Dra. Arícia Correia Fernandes, reforçou: "Embora não haja uma posição final do Supremo Tribunal Federal (STF) a respeito da legitimidade da legitimação fundiária, que é aquela que assegura a propriedade do bem, seja ele público ou privado, e, veja bem, um bem público seria, na verdade, ainda mais do que a usucapião, pois não estabelece os requisitos mínimos de tempo, de posse boa, de posse velha ou de posse nova para que isso aconteça. O que, nas mãos erradas, também pode ser um grande perigo. Mas ela assegura a possibilidade da concessão como direito real da legitimação fundiária e de maneira originária, ou seja, livre de todos os vícios e da possível cobrança de quaisquer tributos."
O membro do fórum, professor colaborador do Mestrado e Doutorado em Cidade da Uerj, advogado e consultor jurídico, Dr. Emerson Affonso da Costa Moura, ressaltou: "O tema de hoje é importante, inclusive para o Fórum Permanente de Direito da Cidade, porque, segundo notícias recentes, existe um déficit habitacional nas cidades de cerca de seis milhões de unidades. Ou seja, temos seis milhões de pessoas que moram em áreas urbanas e não conseguem ter acesso à habitação. No entanto, apesar desse déficit, há aproximadamente 18 milhões de imóveis vazios, segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), o que revela que um dos principais problemas de moradia no Brasil ainda é a especulação imobiliária, na qual o proprietário prefere deixar o imóvel ocioso a destiná-lo efetivamente para fins de moradia. Soma-se a esse cenário o fato de que a União possui cerca de 16 mil imóveis desocupados, absolutamente ociosos. Verifiquei, inclusive, que no Rio de Janeiro há, por parte da Prefeitura, cerca de 16 mil imóveis apenas no município, que aguardam para ser leiloados e, portanto, também compõem um passivo dentro do patrimônio do município sem qualquer utilidade. Assim, temos uma quantidade de imóveis superior à demanda habitacional no Brasil."
O doutor em Direito pela Uerj e advogado, Álvaro Carlos Ramos Barbosa, destacou: "Estamos falando aqui de cidade, de função social da cidade e de função social da propriedade urbana. Acredito que uma forma de resumir essa ideia de função social da cidade é por meio de uma frase da Idade Média que diz: 'O ar da cidade liberta'. Trata-se de uma ideia que contrasta com a estrutura do feudalismo e da servidão ligada à terra, em oposição ao que a cidade oferece para quem nela vive. Os ares da cidade libertam no sentido de romper com a servidão, quase uma escravidão, e também de possibilitar o desenvolvimento dos potenciais individuais. Penso que isso resume bem a ideia de função social da cidade. Quanto à função social da propriedade urbana, eu a resumiria como uma preocupação com o outro, com o terceiro, afastando-se daquela concepção absolutista do liberalismo clássico, segundo a qual o proprietário poderia fazer tudo o que quisesse com a propriedade, sem limitações."
A mestre em Direito pela Uerj e advogada, Maria Isabel Pomaroli, pontuou: "Gostaria de deixar uma pergunta: afinal, o que vem a ser um imóvel público ocioso urbano? Estamos aqui na EMERJ, um imóvel público que, provavelmente, pertence ao Estado do Rio de Janeiro e que, antes de abrigar a EMERJ, já sediou também a Procuradoria Geral do Estado do Rio de Janeiro (PGE/RJ). Então, se a EMERJ desocupasse este imóvel para se transferir para outro espaço e, na semana seguinte, ele permanecesse desocupado, poderíamos considerá-lo um imóvel público ocioso? As balizas de um possível conceito de bens imóveis públicos ociosos no Direito brasileiro se relacionam com a condição de desuso, com a questão da titularidade do domínio e, por último, com a função social que o bem deveria desempenhar, mas não desempenha, seja ele um bem afetado ou não. Para mim, ainda há uma questão essencial a ser respondida: qual é o período temporal de desuso necessário para que possamos considerar um imóvel público como ocioso?"
A doutora em Direito pela Uerj e advogada, Carolyne Rodrigues Ribeiro, declarou: "A primeira coisa que preciso dizer é que, na verdade, o meu tema não trata especificamente de bens públicos, mas sim de uma restrição pública incidindo sobre o bem particular. Ou seja, são áreas particulares que sofrem uma limitação ao direito de construir porque o Estado está reservando aquele imóvel para, futuramente, implantar infraestrutura no local por tempo indefinido. Sabemos que essas áreas ficam reservadas por décadas sem uso e, aqui na cidade do Rio de Janeiro, elas são constituídas por atos administrativos, sendo os famosos Projetos de Alinhamento Aprovado, ou seja, o PAA, para quem é da área do urbanismo. Trata-se de um instituto bastante longevo, na própria cidade do Rio de Janeiro, por exemplo, o prefeito Pereira Passos já o utilizava. E, por ser um instituto tão antigo, precisamos analisá-lo sob a ótica do ordenamento jurídico atual, e não como se estivesse congelado no tempo, preso a décadas passadas."
O mestre em Direito pela Uerj e advogado, Misael Ribeiro Alves, salientou: "O que é cultura? Cultura é a vestimenta, a dança, a culinária, a memória, o folclore, a arquitetura. Cultura não é somente a mensagem, mas também a transmissão dessa mensagem. E o que seria isso? Trata-se da transmissão dessa mensagem entre gerações (intergeracional) e dentro da mesma geração (intrageracional). É importante compreendermos essa noção de cultura porque este estudo busca justificar a sustentabilidade sociocultural nos espaços urbanos, diante dos grandes acervos históricos presentes nas cidades brasileiras. As cidades brasileiras são ricas em acervos históricos que incluem monumentos, edifícios e locais de importância cultural. Apesar dessa riqueza, muitos desses patrimônios não são devidamente utilizados ou reconhecidos. O objetivo da minha pesquisa foi buscar uma solução jurídica, a partir da propriedade pública urbana, para proteger essa mensagem e garantir sua transmissão."
A mestre em Direito pela Uerj e advogada, Nathalia Maia, reforçou: "Quando pensamos na função social dos bens públicos e na função social das cidades, estamos considerando que as nossas Constituições pós-liberais, como é o caso da Constituição de 1988, estabelecem valores e projetos a serem perseguidos. Assim, ao falarmos em função social, referimo-nos à execução desses valores e projetos previstos no texto constitucional, que, aliás, já foi abordado ao longo do dia, como a destinação do bem para moradia e a questão do domínio. No entanto, essas funções também abrangem outros objetivos, que envolvem a concretização dos nossos direitos sociais, como o direito à cultura, o direito ao lazer e outros. Os bens públicos, portanto, devem ser utilizados também com vistas a atingir todos esses objetivos previstos no texto constitucional, inclusive o direito ao lazer."
O mestre em Direito pela Uerj e advogado, Álvaro Edgar Pinho Simão, concluiu: "De acordo com Corbo, uma política pública que privilegie um determinado bairro em detrimento de outro utiliza um critério aparentemente neutro (geográfico). Faz parte da política urbanística a tomada de decisões discricionárias sobre a organização do espaço, eventualmente beneficiando certas áreas e prejudicando outras. Imagine, no entanto, que se verifique, na prática, que o bairro prejudicado conta com uma maioria de habitantes pertencentes a um grupo protegido (por exemplo, pessoas negras), enquanto o bairro beneficiado apresenta um perfil demográfico oposto (por exemplo, de maioria branca). Nesse caso, o critério perde sua neutralidade aparente, produzindo o mesmo efeito discriminatório que decorreria de uma política que expressamente privilegiasse bairros predominantemente brancos em detrimento dos predominantemente negros."
Lançamento de livro
Durante o encontro, houve o lançamento do livro Função Social dos Bens Públicos, de autoria do membro do fórum Emerson Affonso da Costa Moura.
Assista
Para assistir na íntegra, acesse: https://www.youtube.com/watch?v=CajKeD_35fI e https://www.youtube.com/watch?v=hJVcP0rB5zs
Fotos: Jenifer Santos
16 de junho de 2025
Departamento de Comunicação Institucional (DECOM)