Nesta quinta-feira (29), Fórum Permanente de Direito Penal e o Fórum Permanente de Direito Ambiental e Climático, ambos da Escola da Magistratura do Estado do Rio de Janeiro (EMERJ), em parceria com o Grupo Brasileiro da Associação Internacional de Direito Penal (AIDP), a Faculdade de Direito da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (Uerj) e o Instituto de Estudos Avançados da Universidade de São Paulo (USP), promoveram o encontro Governança Climática na COP30 e o Papel do Sistema de Justiça que aconteceu presencialmente no Auditório Desembargador Nelson Ribeiro Alves. Houve transmissão via plataforma Zoom, com tradução simultânea para a Língua Brasileira de Sinais (Libras).
Abertura
O presidente do Fórum Permanente de Direito Penal, desembargador José Muiños Piñeiro Filho, pontuou: “Este evento segue as diretrizes da EMERJ. Primeiro, temos aqui dois fóruns, e isso representa uma sugestão, um incentivo, um ânimo e um estímulo para que os fóruns permanentes trabalhem em conjunto. Hoje, dois fóruns estão atuando: o de Direito Ambiental e Climático e o de Direito Penal, demonstrando que há uma unidade, e que não há atividade da EMERJ que não seja compartilhada. Segundo, a escolha por temas da atualidade: não podemos negar a importância da questão climática. Teremos a COP30, que será realizada no Brasil e que já se aproxima. A questão da Justiça relacionada aos problemas climáticos não é apenas atual — é permanente. São temas do passado, do presente e do futuro. Terceiro, a diretriz da nossa Escola é, dentro do possível, convidar professores de diversas regiões do país. Hoje, temos representantes de todas elas. Além disso, este é um evento internacional: trouxemos um professor da Universidade de Yale.”
O presidente do Fórum Permanente de Direito Ambiental e Climático, desembargador Elton Martinez Carvalho Leme, ressaltou: “Nós vivemos um momento de desordem climática. É um momento em que todas as agressões ao meio ambiente estão condicionadas a essa desordem, o que torna a situação extremamente grave. Eu diria que já passamos do ponto de não retorno. Portanto, quando falamos de governança climática na COP30, enfrentamos um gigantesco desafio: o de compatibilizar interesses e consciências manifestamente desniveladas quanto à importância ou à urgência da questão ambiental e climática no mundo. Vejo que hoje teremos uma abordagem amazônica, sempre muito relevante pelas dimensões do território da Amazônia, que vão além da própria região amazônica. Fico muito feliz por poder, mais uma vez, realizar aqui, conjuntamente com o Fórum Permanente de Direito Penal, esse exercício de repetição de valores que são fundamentais para que a nossa consciência se converta em ações concretas.”
O membro do Fórum Permanente de Direito Penal Dr. Carlos Eduardo Adriano Japiassú relatou: “A ideia do evento é tratar de um tema absolutamente atual e relevante, buscando abordá-lo sob a maior variedade possível de ângulos. Hoje, teremos quatro mesas com olhares distintos sobre a mesma questão, que eu insisto em dizer ser importante e urgente, especialmente se levarmos em conta que vivemos no maior país tropical do mundo e, portanto, temos, necessariamente, uma posição de destaque no cenário global em relação a essa temática.”
O presidente do Grupo Brasileiro da AIDP, Carlos Eduardo Machado, concluiu: “Há uma necessidade muito grande de intercâmbio constante entre as regiões — de ideias, problemas e valores. Esse intercâmbio é muito salutar, especialmente quando lidamos com a questão climática, que é um problema que assusta e preocupa a todos, tanto no hemisfério sul quanto no hemisfério norte. Temos questões macro, como a da Amazônia, e vemos o quanto isso tem, no mundo inteiro, exacerbado os ânimos. Portanto, é efetivamente um tema que exige esse intercâmbio sobre as diferentes formas de lidar com o problema. E, se temos um problema, sempre há caminhos que as pessoas enxergam como possíveis soluções ou como contribuições relevantes. Por isso, é muito importante que, neste momento, em que há também uma dimensão emocional e uma preocupação gigantesca, tenhamos a mente aberta para ouvir o lado acadêmico e isento.”
Governança Climática e Justiça Ambiental
O professor da Universidade de Yale Dr. Thomas Pogge salientou: “Estamos vivendo uma verdadeira emergência climática. A aceleração do aquecimento global ameaça desencadear uma catástrofe de proporções gigantescas. Se não mudarmos o rumo, veremos o nível do mar subir por algumas dezenas de metros, afetando cidades costeiras inteiras. Os trópicos poderão se tornar regiões de calor insuportável, comprometendo a saúde e a sobrevivência de milhões de pessoas. Haverá uma propagação crescente de doenças tropicais, e enfrentaremos escassez de comida e água. Desastres naturais e eventos climáticos extremos se tornarão mais frequentes e mais intensos, e veremos a extinção em massa de espécies de plantas e animais, com impactos irreversíveis sobre os ecossistemas e a biodiversidade do planeta. Diante desse cenário, é urgente que alcancemos uma transformação verde real e profunda. Isso exige que desenvolvamos, e em seguida implementemos de forma rápida e em larga escala, tecnologias e inovações verdes — as chamadas ‘greenovations’. Elas precisam abranger diversos setores: energia, transporte, produção de aço, cimento, alumínio, além de mudanças significativas no consumo de carne. A meta é clara: reduzir drasticamente as emissões e a poluição associada a essas atividades, construindo uma nova economia, sustentável e resiliente, capaz de garantir um futuro habitável para as próximas gerações.”
A secretária de Altos Estudos do Supremo Tribunal Federal (STF), Dra. Patrícia Perrone Campos Mello, reforçou: “A única forma que temos de enfrentar, com eficiência, as mudanças climáticas é por meio de políticas públicas consistentes. E por que estou dizendo isso? Porque vou abordar aqui a contribuição que o Poder Judiciário pode dar para o enfrentamento das mudanças climáticas, mas já reconhecendo, de antemão, que essa contribuição é secundária. O Poder Judiciário atua quando os governos funcionam mal e quando é preciso impulsionar uma agenda que não está sendo adequadamente enfrentada. Quando falo em políticas públicas, refiro-me a um processo, a um conjunto de atos e decisões cujo objetivo é mobilizar o Poder Público e movimentar ações na direção de uma determinada finalidade — que, no caso da crise climática, é o enfrentamento das mudanças climáticas. Essas políticas pressupõem a identificação do problema, a inserção desse problema na agenda, um diagnóstico adequado das causas das mudanças climáticas, como a excessiva liberação de gases de efeito estufa, a formulação de soluções possíveis, a decisão e a escolha por uma política efetiva, sua implementação, a avaliação da efetividade dessa política e, posteriormente, a reformulação com base no que funcionou e no que não funcionou. Esse é o chamado ciclo das políticas públicas, e é por isso que o Judiciário é um ator secundário nessa tarefa.”
A moderação da mesa ficou a cargo da vice-presidente do Fórum Permanente de Direito Ambiental e Climático, juíza Admara Schneider, e o debatedor foi o membro do Fórum Permanente de Direito Ambiental e Climático Dr. Flávio Ahmed.
Justiça Ambiental no Contexto da Amazônia Brasileira
O defensor público do Estado do Amazonas Dr. Carlos Alberto Souza de Almeida Filho elucidou: “A destruição causada na Amazônia é responsabilidade de todos nós — por conveniência, por apatia ou por indiferença — e é justamente contra isso que devemos lutar. Com base nesse pressuposto, eu, defensor do Amazonas, trago uma visão sobre aquilo que vejo por lá. Muitas pessoas não têm ideia da magnitude do Amazonas. Trata-se de um território gigantesco, com quase dois mil quilômetros de extensão de leste a oeste e cerca de mil e duzentos de norte a sul. É algo realmente monumental. E nessa imensidão — maior do que muitos países do mundo — existem apenas 62 municípios, alguns com territórios enormes. Discutir a Amazônia de forma simplificada é tentar encapsular uma diversidade de realidades que não pode ser abordada de maneira apressada. Isso é um ponto importante. Nós, defensores, temos uma relativa vantagem e privilégio por conhecer de perto a região, pois temos contato direto com a população. Isso nos permite traduzir a dura realidade que vivenciamos no dia a dia para ambientes como este, para o mármore dos tribunais e para o academicismo necessário. Esse processo é fundamental para que a realidade que vemos lá seja compreendida de forma mais clara e assertiva. Precisamos fazer com que aquelas vozes esquecidas sejam ouvidas.”
A moderadora do painel foi a membra do Fórum Permanente de Direito Climático e juíza federal do Tribunal Regional Federal da 2ª Região (TRF2) Ana Carolina Vieira de Carvalho, e a debatedora a professora do PPGD-Unesa Dra. Isabella Franco Guerra.
Segurança Pública e Justiça Ambiental
O professor do Mestrado em Direito Penal da Uerj e juiz do Tribunal de Justiça do Estado de Rondônia (TJRO) Arlen Souza relatou: “Esse assunto é muito sensível e desafiador, na medida em que não conseguimos progredir no enfrentamento dessas dificuldades. Temos um discurso que é, até certo ponto, adequado, mas uma prática pueril. Talvez as crianças sejam mais efetivas em promover o bem-estar ambiental do que nós, adultos — e isso é muito preocupante. É interessante discutirmos como essa questão se insere no nosso cotidiano. Parece que fazemos tantas coisas e, ao mesmo tempo, não conseguimos realizar nada de concreto. Quando digo isso, penso, por exemplo, em por que a chuva em Petrópolis mata tantas pessoas; por que ocorrem inundações tão severas quando o Rio Madeira sobe, forçando o deslocamento de famílias inteiras; ou por que, em tempos de seca no Amazonas, dentro de uma das bacias hidrográficas mais ricas do mundo, é necessário distribuir água mineral à população. Se não contextualizarmos esses fatos e não compreendermos que temos condições de prever, mas não agimos, então, em nenhum momento, teremos capacidade de governança diante dessas grandes dificuldades. Ora, como posso planejar políticas públicas se essas realidades não me sensibilizam? E, quando não sentimos isso verdadeiramente, certamente o nível de autoridade, e de compromisso, é nulo.”
O pesquisador da USP Dr. Eduardo Saad-Diniz ressaltou: “Uma nota técnica, divulgada no ano passado, já identifica um processo de desertificação no interior do Estado da Bahia. E eu não quero voltar aqui daqui a dez anos e constatar que existe um deserto brasileiro. Pensar essa interface hoje vai muito além do território amazônico. Avançar no pensamento sobre o papel do Sistema de Justiça na segurança climática é uma emergência de primeiríssima grandeza. Todas as tendências planetárias acabam nos situando como ‘Custodians of the Amazônia’, ou seja, as pessoas responsáveis por garantir a preservação da Amazônia. Mas, nas últimas oito décadas, onde estava todo mundo? E agora, somos nós — novamente, com absoluta escassez institucional e material — que somos colocados na condição de protagonistas. Quais são as condições concretas para o exercício desse papel de garantidores da Amazônia? É justo que, além de sermos os mais vitimizados, também sejamos os responsáveis por levar adiante esse processo? Não seria o caso de existir um modelo de regulação planetária diferenciado?”
A moderação da mesa ficou a cargo da membra do Fórum Permanente de Direito Penal e juíza Alessandra de Araújo Bilac Moreira Pinto, e os debatedores foram o membro do Fórum de Direito Penal e desembargador do TRF2 Abel Fernandes Gomes e o presidente do Instituto de Ciências Penais e desembargador do Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais (TJMG), Henrique Abi-Ackel.
Sistema Penal e Justiça Ambiental
O professor de Direito Penal da Uerj e da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) Dr. Antonio Martins destacou: “A relação entre proteção ambiental e Direito Penal é, de todo modo, uma relação especialmente complexa que pode ser vista e abordada por diferentes perspectivas: filosófica, metodológica, criminal, política, ética, política criminal e também dogmática, e me parece que no fundo essas questões acabam por se entrelaçar de alguma maneira, embora eu tenha por objetivo centralizar a minha abordagem especialmente intricada na dogmática da imputação por omissão, em casos de delitos ambientais. “
E concluiu: ”Estabelecer um domínio de controle sobre aquilo que se deixa de fazer é um problema complexo que provavelmente nos levaria a um desenvolvimento rigoroso das questões da autoria dos delitos de omissão, em segundo lugar nós temos dúvidas advindas da própria legislação penal, quanto a qual é o objeto específico da responsabilização. Nós devemos insistir cada vez mais na preservação de estruturas preventivas e na formulação de novas estruturas preventivas. Nós ainda temos um longo caminho a ser trilhado na responsabilização penal adequada a graves e complexos danos ambientais.”
A presidente do Grupo de Jovens Penalistas da AIDP, Dra. Isabelle Gibson, pontuou: “A gente precisa refletir com cautela que os aspectos relacionados à reparação e à conservação do meio ambiente e também aos anseios das vítimas e às necessidades das comunidades atingidas e até às lideranças comunitárias não são contemplados de maneira prioritária na resposta penal. Portanto, pensar em proteger o meio ambiente e reparar esses danos ambientais já causados apostando os nossos esforços no Direito Penal e no Sistema de Justiça Criminal não me parece ser o melhor caminho para essa finalidade.”
O moderador da mesa foi o vice-presidente do Fórum Permanente de Direito Penal, desembargador Marcos André Chut, e o debatedor foi o assessor da diretoria jurídica do BNDES, Leandro de Matos Coutinho.
Encerramento
O encontro foi encerrado pelos desembargadores José Muiños Piñeiro Filho e Marcos André Chut; pelo presidente do Grupo Brasileiro da AIDP, Carlos Eduardo Machado; e pelo pesquisador da USP Dr. Eduardo Saad-Diniz.
Assista
Para assistir na íntegra, acesse: https://www.youtube.com/watch?v=nRkaaKidAiA e https://www.youtube.com/watch?v=7epqOl37a7Q
Fotos: Maicon Souza
29 de maio de 2025
Departamento de Comunicação Institucional (DECOM)