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Debate “Perspectivas morais do garimpo nas terras indígenas” é realizado pela EMERJ

Nessa segunda-feira (22), a Escola da Magistratura do Estado do Rio de Janeiro (EMERJ) promoveu, por meio do Fórum Permanente de Filosofia, Ética e Sistemas Jurídicos, o webinar “Perspectivas morais do garimpo nas terras indígenas”.

O encontro teve transmissão via plataformas Zoom e YouTube.

Abertura

“Temos a oportunidade de tratar de um assunto extremamente esquecido e extremamente importante na convivência nacional brasileira”, pontuou em sua fala de abertura o presidente do Fórum, Vicente de Paulo Barretto, doutor em Filosofia pela Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro (PUC-RIO), professor do Programa de Pós-Graduação da Universidade Estádio de Sá (Unesa), professor emérito da Universidade do Vale dos Sinos (UNISINOS) e professor coordenador do Grupo de Pesquisa Moral, Direito e Estado Democrático de Direito da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (Uerj).

Além de jurídica, uma questão moral

Fernanda Frizzo Bragato, doutora em Direito pela UNISINOS e professora do Programa de Pós-Graduação em Direito e coordenadora do Núcleo de Direitos Humanos da UNISINOS, afirmou: “Um assunto esquecido, mas que recentemente acabou recebendo maior atenção da sociedade brasileira, da mídia e, especialmente, do governo. As terras indígenas representam mais ou menos 13% do território nacional e são as áreas de maior preservação do meio-ambiente no país. Juridicamente falando essa questão dos garimpos não é de grande complexidade, porque a presença desses garimpeiros dentro da terra indígena Yanomami, por exemplo, é completamente ilegal. O marco jurídico das terras indígenas no Brasil é bastante claro e tem status constitucional. A mineração, como qualquer exploração, nessas áreas requer regulamentação e isso ainda não foi feito. Então, não resta outra medida ao governo se não retirar esses garimpeiros das terras indígenas. Temos um arcabouço jurídico muito robusto de proteção dos povos indígenas no Brasil, mas uma prática totalmente dissociada dos mandamentos constitucionais. Acredito que o temos de fato, que talvez explique não só a presença de tantos garimpeiros com tanto apoio político bem como a resistência de certos setores do governo em retirá-los de lá, é uma questão moral”.

O procurador da República Marco Antônio Delfino de Almeida, mestre em Antropologia Social pela Universidade Federal da Grande Dourados (UFGD), especialista em Direito Constitucional pela Universidade Anhanguera (UNIDERP) e doutorando em História Indígena pela UFGD, ressaltou: “Talvez um dos aspectos mais normalizados de uma sociedade dominante é o fato de se entender que existe apenas uma realidade possível. Nós não conseguimos nos apropriar dos movimentos das sociedades indígenas que muitas vezes acabam julgadas como primitivas e selvagens. Efetivamente o que nós temos é uma perspectiva de racismo, é uma visão de que essas pessoas são seres descartáveis, menos valiosos do que a mercadoria extraída, como se fossem impurezas que são enfrentadas, irrelevantes. Esse conceito desumanizador é algo presente na questão indígena”.

“Pela sua relação com a terra e com o mundo, os indígenas são vistos como seres irracionais, e aí começam os discursos desumanizantes. Logo, o problema de proteger as terras indígenas contra essa exploração econômica vinda do garimpo deixa de ser uma questão meramente jurídica. Mesmo com o reconhecimento do direito dos povos indígenas, o Legislativo e o próprio Judiciário criam diversos entraves para dificultar a demarcação de terras e a proteção desses povos. Então, o que temos na questão indígena, desde que os europeus aportaram no continente americano, é um problema ideológico, um embate entre duas visões de mundo, uma dominante, que acaba sendo protegida pelo Direito Civil, e uma outra marginal e desprestigiada pelo mais convicto e remoto arsenal ideológico da cultura ocidental: o de que o direito sobre as coisas só se reconhece a quem, pela sua superior racionalidade, saiba fazer uso racional delas, produzir, extrair e acumular. A usurpação, o desejo de uso das terras indígenas, a violência, se legitimam em nome do interesse racional econômico e qualquer tentativa de proteger ou restituir o que lhes é de direito, inclusive por determinação constitucional, é desmontada por discursos que os desqualificam e os depreciam como pessoas inúteis, muito embora a crise climática e a degradação ambiental, promovida por esse modelo racional econômico venha nos provando justamente o contrário. Argumentos dessa natureza servem para negar a proteção das terras indígenas, porque se nega a eles a própria condição de plenos sujeitos de direitos. Por isso que acabamos tendo uma série de combinações entre interesses econômicos, legitimados por uma visão moral predominante do ocidente moderno, e discursos desumanizantes sobre as populações indígenas que legitimam a violência”, prosseguiu a professora Fernanda Frizzo Bragato.

Garimpo, proteção ambiental e questões indígenas

O coordenador do evento Marcos Carnevale Ignácio da Silva, membro do Fórum, doutor em Direito pela Unesa e professor secretário do Grupo de Pesquisa Moral, Direito e Estado Democrático de Direito da Unesa, questionou: “Já que temos a legislação protetiva, mas que não consegue proteger até onde devia, apesar de não ser a solução enxergar os povos indígenas como guardiões do meio ambiente, não seria pelo menos uma saída que atrai a comunidade mundial para essa luta?”.

O procurador da República Marco Antônio Delfino de Almeida destacou: “Por que nos preocupamos muito mais com áreas desmatadas do que com carne derivada de áreas indígenas, por exemplo? Talvez muito da proteção indígena de hoje derive do fato deles se denominarem como guardiões da floresta. Isso só mostra como consideramos essas pessoas como seres desimportantes. Como nós conseguimos estabelecer a ideia de não comprar produtos de áreas desmatadas, mas quando caminhamos para produtos supérfluos, ainda que haja utilidades industriais como o ouro, porque não estabelecemos o mesmo parâmetro de rigor? Por que eles vêm de terras indígenas?”.

“Existe toda uma facilidade na legislação brasileira para o ouro. Basta uma autodeclaração de quem extraiu sobre sua origem para que ele seja considerado um produto de procedência legal e adentre as cadeias de produção sem nenhum problema de vício de origem. Essa é outra questão extremamente importante para proteção das terras indígenas: que se promova um maior rigor na comprovação da origem do ouro. Essa falta de regulação da cadeia produtiva é um incentivo para a prospecção do garimpo em terra indígena. Moralmente falando, me parece que tudo isso faz parte desse descaso, dessa negligência em relação à proteção dos direitos e interesses indígenas, porque sabemos que existe um potencial minerário gigantesco em determinadas terras indígenas”, frisou a professora Fernanda Frizzo Bragato.

“É interessante porque é um paradoxo. Isso mostra que consideramos eles como protetores do meio-ambiente, mas desde que seja da forma que entendemos como adequada. Mas do ponto de vista objetivo, quando se olha o mapa de desmatamento, se vê que as áreas protegidas são as áreas indígenas. É um aspecto interessante e que tem contribuído de uma forma importante para que os povos indígenas sobrevivam e tenham a proteção de seus territórios”, salientou o procurador da República Marco Antônio Delfino de Almeida.

A professora Fernanda Frizzo Bragato concluiu: “Os povos indígenas concebem e estabelecem sua relação com a terra de forma profundamente diversa daquela que nós, povos ocidentais, estabelecemos. Eles se veem como parte dela e não a usam com fim exclusivamente de exploração econômica. A terra para os indígenas é a base fixa de seus territórios, um espaço imprescindível para o desenvolvimento de seu modo de vida, inclusive com significado espiritual. Então essa forma de relação é incompreensível do ponto vista epistemológico e inaceitável do ponto de vista ético para os padrões ocidentais, que veem na terra um recurso econômico a ser explorado para extrair o máximo de riquezas possíveis”.

Assista

Para assistir ao encontro na íntegra, acesse: https://www.youtube.com/watch?v=o96fYlLmjJk 

 

Fotos: Jenifer Santos

23 de maio de 2023

Departamento de Comunicação Institucional (DECOM)