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EMERJ realiza nova edição do “Café Filosófico”

A Supervisão de Biblioteca e Cultura da Escola da Magistratura do Estado do Rio de Janeiro (EMERJ), responsável pela gestão da Biblioteca TJERJ/EMERJ Desembargador José Carlos Barbosa Moreira, promoveu nessa quarta-feira (30), a nova edição do programa cultural “Café Filosófico”, com apresentação sobre o livro "O Rabino do Mundo”, de autoria do procurador do estado do Rio de Janeiro Gustavo Binenbojm.

O evento aconteceu no Auditório Desembargador Paulo Roberto Leite Ventura e teve transmissão via plataforma Zoom.

Abertura

O diretor-geral da EMERJ, desembargador Marco Aurélio Bezerra de Melo, doutor em Direito pela Universidade Estácio de Sá (Unesa), destacou em sua fala de abertura a importância da Biblioteca TJERJ/EMERJ Desembargador José Carlos Barbosa Moreira, que detém um dos maiores acervos de livros jurídicos do Brasil, e tem ampliado sua oferta de obras, tanto da área do Direito, como das demais ciências afins. O diretor-geral também frisou o aumento do número de frequentadores e de acesso às instalações da biblioteca e incentivou novas visitas ao espaço.

Em sequência, o desembargador Marco Aurélio Bezerra de Melo afirmou sobre o procurador do estado do Rio de Janeiro Gustavo Binenbojm: “Como se não bastasse seu vasto currículo, ele também é um militante da liberdade de expressão. Uma referência que temos no Rio de Janeiro, e no Brasil, de um operador do Direito sempre atento a qualquer ataque que a democracia ou o direito fundamental da liberdade de expressão sofram”.

Palestra

O autor do livro “O Rabino do Mundo”, Gustavo Binenbojm, procurador do estado do Rio de Janeiro, vice-presidente do Fórum Permanente de Liberdade de Expressão, Liberdades Fundamentais e Democracia da EMERJ, professor de Direito Administrativo da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (Uerj) e da Pós-Graduação em Direito da Fundação Getúlio Vargas (FGV), professor emérito da EMERJ, mestre em Direito Público pela Uerj, Master of Laws (LL.M.) pela Yale Law School e doutor em Direito Público pela Uerj, disse: “Esse livro é organizado em 24 capítulos curtos, como se fossem pílulas sobre o pensamento de Jonathan Sacks, que sempre se destacou como uma voz não apenas importante do judaísmo, mas do humanismo mundial. Escrever esse livro foi uma aventura literária. Destaco um trecho, que talvez tenha sido o primeiro ponto de conexão meu com a obra de Sacks. Ele fala: ‘o sentido está onde a paixão encontra o dever, onde o que você ama fazer encontra o que você sabe que deve fazer’. Toda vez que alguém se pergunta pelo sentido da vida, ela responde nos dizendo qual a responsabilidade devemos assumir perante a vida”.

Binenbojm prosseguiu: “Sacks tinha um pensamento tão humanístico, tão atual, que escreveu, inclusive, sobre as redes sociais em sua obra ‘Morality’. Ele fala de maneira muito precisa para as novas gerações que o mundo virtual das redes sociais é o mundo do imperdoável, em que qualquer pequeno deslize, erro ou pecado rende a pessoa um cancelamento virtual, quando não um linchamento físico. Esse é o mundo que vivemos hoje e ele se pergunta: ‘um mundo onde os erros não sejam perdoados é um mundo onde apenas os cruéis e os cínicos sobrevivem’. A ideia básica do ser humano, e na qual toda filosofia judaica está predicada, é a da possibilidade do perdão. O judaísmo legou a humanidade a capacidade de combinar o eu com o nós. A preocupação com a dimensão individual da vida e com a dimensão comunitária. A origem do reconhecimento da dignidade da pessoa humana, do ser humano como um fim em si mesmo e não como meio para a satisfação dos interesses de outras pessoas, o marco fundamental é a história do sacrifício de Isaque”.

“Existem razões pessoais profundas que me levaram a escrever esse livro, quando me conecto e me emociono com minha história familiar, que envolve meus antepassados. Digo no livro que muitos dizem que o judaísmo lhes interessa porque ele é dialético, em uma referência a Hegel e depois ao materialismo histórico de Marx, da tese e da antítese, mas eu diria mais: o judaísmo se insere em uma tradição sapiencial ligada ao paradoxo. O judaísmo é simplesmente paradoxal. Há outras culturas no mundo que cultivam o paradoxo como uma forma de aprendizado, como a cultura chinesa com Confúcio, que dizia ‘que todos nós temos duas vidas, mas a segunda só começa quando nos damos conta de que a vida é uma só’, uma frase profundamente judaica. Na ideia da dialética sempre se tem uma tese e uma antítese muito claras. O paradoxo não. O paradoxo implode uma linha de argumentação e te deixa sem chão, para depois abrir outras formas de pensar problemas absolutamente desconcertantes”, declarou em sequência o autor do livro.

Gustavo Binenbojm continuou: “Destaco no livro três paradoxos do judaísmo. Um é entre o eu e o nós; nenhuma religião é tão focada no individualismo como o judaísmo, mas nenhuma também dá tanta ênfase aos compromissos coletivos do indivíduo em sociedade, porque viver é sempre conviver. Não à toa grandes capitalistas, banqueiros foram judeus e Karl Marx era judeu também. Os judeus estão sempre dos dois lados, do indivíduo e da coletividade, da liberdade individual e dos nossos compromissos com a comunidade. O segundo paradoxo é entre escolher e ser escolhido. Sacks fala muito sobre isso e fala muito bem. Em toda sua passagem de 11 anos até a morte pela Câmara dos Lordes, ele foi certamente a voz mais poderosa do mundo contra o antissemitismo e fazia isso com sabedoria e certo senso de humor. Uma das epígrafes do livro, o capítulo sobre antissemitismo é uma ironia: ‘Meu antissemita favorito’. Ele está falando de ninguém menos do que Nietzsche, talvez um dos três ou quatro maiores filósofos do Século XX. Ele dizia que muitos odeiam o judaísmo por ter rejeitado o cristianismo, mas Nietzsche odiava o judaísmo porque ele criou o cristianismo. É uma verdade, os primeiros cristãos eram judeus. É o mesmo problema de Voltaire, que odiava qualquer religião, era um agnóstico militante. O que acho mais interessante nessa discussão é que Sacks falava que o antissemitismo é um produto da ignorância e muitas vezes de sentimentos que as pessoas não conhecem e cita um paradoxo de Freud, também citado no livro, que é uma frase que acho muito saborosa: ‘a inveja é a forma mais sincera de admiração’. Muitas vezes o que você odeia tem alguma coisa que você não tem. Certamente nessa questão o Sacks era muito franco, de uma comunicação muito direta e simples, que qualquer pessoa consegue entender a mensagem, que era a questão fundamental de entender que os judeus eram o povo eleito, uma ideia mal compreendida, porque na primeira oração judaica que é o ‘Shemá’, que significa ouçam, ouçam a mensagem de Deus, então ele diz: ‘os judeus não são o povo escolhido, são o povo capaz de escolher. Não foi Deus que escolheu os judeus, foram os judeus que escolheram seguir a Deus. A quantos outros a mensagem pode ser dita eles não tiveram ouvidos para ouvir?’. Acho que a raiz do antissemitismo é a ideia paradoxal dos judeus terem sobrevivido aos quase quatro mil anos de história, enquanto todos os outros povos da antiguidade pereceram e desapareceram. Por que não ceder a uma cultura universalista que igualará a todos? Por que insistir na dignidade da diferença de uma crença que rendeu tantas perseguições? Sacks diz que hoje a ideia de universalidade mais contemporânea não é a ideia de igualação. A imposição de uma igualdade em uma única cultura é profundamente autoritária, se não totalitária. As pessoas têm direito a ser quem são e cultivar sua própria identidade. O reconhecimento da dignidade da diferença, esse paradoxo ‘somos todos diferentes, mas iguais’ é o que permite a cada pessoa ser quem é e estar no mundo como pode estar, cultivando suas diferenças, sem que isso necessariamente ofenda ninguém, exige apenas um exercício de tolerância e respeito para a igualdade na diferença e não uma igualdade artificialmente imposta a todos”.

“O último paradoxo é o entre a vida e o mundo vindouro no judaísmo. Há religiões hoje, como na antiguidade, obcecadas com a ideia da morte, de que a realização profunda do ser humano se dará depois do fim da vida. A ideia de um mundo vindouro seria o tempo da redenção. O mundo é um mar de lágrimas e a felicidade se encontra além-túmulo e não aquém-túmulo. Isso causa muita dificuldade de compreensão na cultura judaica e Sacks procurou explicar isso. Ele diz que é muito clara no judaísmo a crença no mundo vindouro e na ressurreição dos mortos, mas a mensagem judaica foi a primeira no mundo todo que afirmou a sacralidade da vida. A vida não é um bem disponível, não pode ser negociado, é um direito absoluto de todos. Moisés disse: ‘a maior coragem é acreditar na vida e não na morte. Escolham a vida’. Ou seja, sempre que se vir diante de uma questão que envolva injustiça no mundo, a opção do ser humano é crer na vida, lutar pelo aperfeiçoamento do mundo. Sacks diz: ‘a fé judaica é uma forma de protesto. É aceitar, sem negacionismos, o mundo pelo que ele é e acreditar profundamente que somos capazes de viver pelo mundo tal como ele deveria ser’. Esse é o nosso compromisso”, ressaltou o procurador do estado do Rio de Janeiro.

Por fim, o autor do livro concluiu: “Esse é um livro simples. Não é um livro histórico, nem sobre teologia. É um livro escrito direto do coração. Meus avós paternos fugiram da guerra na década de 30, tentaram um visto para os Estados Unidos, não conseguiram e vieram para o Brasil. Meu avô veio com o irmão, sem falar uma palavra de português. Trabalharam e em 1935 ele conseguiu mandar dinheiro para trazer minha avó paterna e meu tio. Em 1936 nasceu meu pai. Meus avós paternos fizeram uma escolha muito comum dos judeus em diáspora marcados pela perseguição, quando o medo permanece dentro deles, mesmo depois de fugirem. Esse medo se intensificou depois do que aconteceu na Europa e eles escolheram afastar os filhos do judaísmo de maneira radical, sem dar educação judaica aos filhos. Isso chegou até mim como uma história de negação, uma tradição escondida. Acontece que meu avô paterno, que havia escondido dos filhos sua história e sua origem, procurou o neto mais novo, que vem a ser eu. Nunca ninguém soube que meu avô tinha um irmão mais novo que veio a morrer em Auschwitz. Histórias extraordinárias que eu jamais entendi e nem porque meu avô queria ter esse contato comigo. O que acontece na vida é que não esperamos. Anos depois me apaixonei por uma judia, me inseri no judaísmo e tive uma conversa, a mais importante, com um rabino aqui do Rio chamado Nilton Bonder. Eu contei essa história e ele me disse: ‘para mim só é judeu quem tem um neto judeu, quando se passa o bastão e entrega a ele o melhor de você, que é seu testemunho de vida’. Nessa hora caiu a ficha. Meu avô não queria morrer sem me contar, sem ser judeu, ele não queria que aquela história desaparecesse em seu próprio túmulo. Essa é a forma de imortalidade mais bonita, que aquilo de alguma forma se perpetuasse e o conhecimento fosse transmitido. Na pandemia, quando o câncer do meu pai voltou, durou três meses. Ele ficou em casa, eu ia conversar com ele e toda vez que eu precisava me inspirar para pensar na vida e não na morte, o Sacks foi meu companheiro. Eu perguntei para o meu pai, se ele queria, já perto de se despedir, que eu dissesse o 'Kadish', que é a oração judaica dos enlutados. Tamanha era a interdição que foi ensinada que ele deveria se afastar daquilo, ele não disse sim, apenas balançou a cabeça, chorou e concordou. Eu entendi que aquilo seria bonito, o registro simbólico de uma histórica que ele não havia vivido, mas que iria se perpetuar através de mim e das minhas filhas. E essa é a história desse livro, uma terapia pessoal”.

Encerramento

O diretor-geral da EMERJ, desembargador Marco Aurélio Bezerra de Melo, frisou: “Deve ter sido muito doloroso para seu avô e seu pai, mas também deve ter sido bonito o momento em que perceberam que você levaria isso para frente. Também pensei na importância do perdão. A dificuldade que temos de não errar e a dificuldade de nos perdoarmos. Talvez seja o momento mais difícil, a máxima: amar a Deus, ao próximo e a si mesmo. Essa última é a parte mais difícil. Lidarmos com o erro, nos perdoarmos e seguirmos a nossa jornada”.

A desembargadora Ana Maria Pereira de Oliveira, membra do Conselho Consultivo da EMERJ e magistrada supervisora de Biblioteca e Cultura, pontuou ao encerrar o encontro: “Estou encantada. Foi uma fala das mais bonitas. É um livro simples, mas que encanta e ouvindo a palestra descobri o porquê. Fico pensando em um ambiente de uma Escola diferenciada como a EMERJ, como é importante tratarmos de temas tão diversos. E no livro, o Gustavo cita Sacks falando de educação: ‘porque para defender um país é necessário um exército, mas para defender uma civilização são necessárias escolas. Precisamos de educação como um diálogo contínuo entre gerações. Qualquer que seja a sociedade, a cultura e a fé precisamos contar aos nossos filhos, e eles também aos filhos deles, sobre os valores que nos inspiraram nos objetivos que nos moveram até aqui. Precisamos, sobretudo, confiar que chegarão mais longe do que nós, quando chegar sua vez de escrever o seu capítulo da história’. Li esse trecho porque estamos em uma Escola e acho que você está mostrando ao seu avô que está chegando mais longe nessa história”.

Livro

O autor entrelaça preceitos religiosos e experiências pessoais com ensinamentos que podem ser aplicados no dia a dia, seja com dilemas como o medo da morte e a busca por um sentido na vida, ou por questões mais passageiras, como diálogos e reações na internet.

O livro é inspirado principalmente na obra de Jonathan Sacks (1948-2020), uma das maiores lideranças espirituais de seu tempo, que construiu uma obra detalhada sobre o judaísmo e os valores humanistas.

Assista 

Para assistir na íntegra, acesse: https://www.youtube.com/watch?v=w_GSmrl2u_I

 

Fotos: Maicon Souza

31 de agosto de 2023

Departamento de Comunicação Institucional (DECOM)