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EMERJ realiza encontro “O erro judiciário como exercício equivocado de alteridade”

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A Escola da Magistratura do Estado do Rio de Janeiro (EMERJ) realizou, nesta terça-feira (18), o evento “O erro judiciário como exercício equivocado de alteridade”.

O encontro, promovido pelo Fórum Permanente de Direitos Humanos em parceria com o Núcleo de Pesquisa em Gênero, Raça e Etnia (NUPEGRE) do Observatório de Pesquisas Bryant Garth, aconteceu no Auditório Desembargador Paulo Roberto Leite Ventura. Houve transmissão via plataforma Zoom, com tradução simultânea para a Língua Brasileira de Sinais (Libras).

Abertura

O presidente do Fórum, desembargador Caetano Ernesto da Fonseca Costa, 1º vice-presidente do Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro (TJRJ) e mestre em Cidadania e Direitos Humanos: Ética e Política pela Universidade de Barcelona, conduziu a abertura da reunião e destacou: “Esse é mais um evento extremamente importante da nossa Escola. Uma das causas do erro judiciário, que é preciso que admitamos e reconheçamos essa incidência mais alta do que gostaríamos, também decorre dessa falta de sensibilidade, alteridade e empatia em relação aos invisibilizados e pessoas, evidentemente, que sofrem algum tipo de dificuldade na questão do acesso à Justiça”.

Palestras

O presidente do Tribunal Regional Federal da 5ª Região (TRF5), desembargador Fernando Braga Damasceno, professor do Mestrado Profissional da Escola Nacional de Formação e Aperfeiçoamento de Magistrados (Enfam) e doutor em Direito pela Universidade Federal de Pernambuco (UFPE), afirmou: “O senso comum pensa na figura do juiz como aquele juiz artesão, que recebe os argumentos das partes e profere uma decisão tentando pacificar um caso. Mas a figura do juiz vem evoluindo no Brasil. Passamos por um processo recente, que ainda estamos atravessando, em que se concluiu que essa figura não é suficiente para fornecer uma jurisdição a contento. Passou-se então para a ideia do juiz gestor, juntamente com a figura do juiz formador, baseado no entendimento de que o elemento humano, elemento essencial para a jurisdição, deve ser foco de preocupações justamente por se concluir que não se pode fazer evoluir o serviço jurisdicional senão através de um aperfeiçoamento permanente e de uma formação inicial com qualidade. E, por último, acredito que algo inédito no mundo, a Enfam criou a figura do juiz pesquisador, formando um corpo de pesquisadores, de cientistas dentro do próprio Judiciário, que impõe um olhar crítico”.

“A verdade é que o erro judiciário sempre preocupou o inconsciente coletivo, parecia mais um problema intuitivo do que algo que realmente afetasse a realidade do Judiciário. Isso veio mudando nos últimos 20 anos por uma alteração do contexto. Os erros sempre foram vistos como excepcionais e insignificantes numericamente, mas com algumas mudanças, por exemplo, nos meios de comunicação, se consegue mais acesso a casos de erro. Esse novo protagonismo, além dessa facilitação dos meios de comunicação, se deve a um novo protagonismo social. Outro fenômeno é uma revolução tecnológica que repercutiu diretamente na demonstração de casos de erro, com destaque para o que se chama de Revolução DNA, mas podemos agregar também outras tecnologias relacionadas principalmente ao uso de imagens. Ou seja, o quadro atual não é mais compatível com um simples ato de fé na acurácia do sistema de Justiça, porque existem elementos concretos que permitem uma boa cognição sobre os eventos do passado e que colocam em xeque determinados julgamentos e condenações”, prosseguiu o presidente do TRF5.

Em sequência, o desembargador federal Fernando Braga Damasceno salientou: “O que nos dizem esses casos de erro? Que devemos melhorar o nosso serviço e existem vários caminhos a percorrer. Mas por que olhar para os erros? Os erros são inconvenientes, geram perplexidade e baixam a credibilidade do sistema. Esses casos de erros acumulados têm a capacidade de superar o velho argumento de que os erros do nosso sistema são excepcionais e têm uma proporção diminuta, porque todos esses casos mostram que a sua descoberta que é excepcional. Eles são descobertos a partir de elementos e fatores aleatórios, que fazem com que a excepcionalidade da descoberta seja uma explicação melhor que a excepcionalidade do erro. Esses casos acumulados, aliás, mostram que não temos a mínima de noção de como anda nosso sistema, de como e por que se erra. Não temos nenhuma aferição quantitativa nem qualitativa. Isso diante de um quadro onde, pelo menos em um passado não tão recente, nem o Judiciário nem a academia se preocupam com erro em si. Mas volto à pergunta: por que olhar para o erro? Claro que podemos pensar em melhorar o sistema a partir de reflexões teóricas e reduzir o risco de erro inerente ao sistema, mas há muito tempo o ‘é errando que se aprende’ deixou de ser uma máxima do senso comum e virou uma metodologia de conhecimento voltada ao aperfeiçoamento de sistemas arriscados, como, por exemplo, o sistema de transporte aeroviário. Ou seja, desprezar o erro como fonte de evolução e conhecimento é algo que não se justifica, mesmo porque há um argumento de ordem ética que, embora esquecido, é inerente a qualquer ordem democrática que se estrutura em torno da dignidade humana: reconhecer a falibilidade é algo natural e essencial, e pensar em reduzir, prevenir e corrigir erros é essencial em uma ordem democrática. Isso desautoriza que se desconsidere uma forma indispensável de evolução, que é o aprendizado com os erros”.

“Existe uma ciência da prevenção do erro, que é a chamada safety science, e ela traça um caminho para essa evolução baseada no erro. Primeiro, é uma mudança cultural. O senso comum associa o erro à culpa e vergonha e esse talvez seja o maior obstáculo. Há um mito que também deve ser superado, que é a ideia de que reconhecer a falibilidade de um sistema afeta sua credibilidade. Muito pelo contrário. Também é preciso tentar desvincular a ideia do erro judiciário como um erro humano e não de um sistema, é preciso tirar o foco do indivíduo e fazer um mea culpa institucional. Outro mito é abandonar essa concepção newtoniana de causa e efeito, o isolamento de causas atrapalha a evolução na medida em que impede que se olhe o sistema como um todo. O que falta fazermos então? Transformar o erro em objeto central de uma análise científica, quem sabe, inclusive, de uma disciplina. Precisamos de um vocabulário para lidar com o erro. Deve-se pensar em criar um sistema oficial de investigação e descoberta de erros. Hoje temos um protagonismo da sociedade civil organizada, mas o impacto direto na vida das pessoas que são inocentadas, por exemplo, é muito pequeno se comparado ao sistema como um todo. Temos que pensar em aperfeiçoar o subsistema de correção de erros. Precisamos ainda criar um banco de dados de informações sobre erros, absolutamente necessárias ao conhecimento do sistema, para termos noção exata do quão se erra, do risco que se traz, do que gera o erro e do que se pode fazer para contê-los. Relacionado com o problema do erro judiciário, do reconhecimento e sua prevenção também está necessariamente o problema da indenização dos erros. Para o sistema evoluir, ele precisa reconhecer que é falível, então, é preciso uma adequação constitucional ao modelo de responsabilização do Estado por erros jurisdicionais. Já foi superada, na maioria dos países, a ideia de que para o funcionamento da jurisdição um componente necessário é o reconhecimento de que ela é íntegra e infalível. Por exemplo, a questão da prisão preventiva longa seguida de absolvição como um não erro é algo primitivo”, continuou o presidente do TRF5.

O desembargador federal Fernando Braga Damasceno concluiu: “Um dos primeiros passos que se deve pensar, se o desejo é evoluir, é nesse mea culpa organizacional e ver que o erro não é do juiz, de um indivíduo, é um erro do sistema desde quando se desenhou o currículo da graduação em Direito. O erro judiciário não pode ser encarado mais como um tabu. É um desafio sistêmico que requer abordagem rigorosa e orientada a soluções”.

A advogada criminalista Dora Cavalcanti, diretora do Innocence Project Brasil e conselheira nata do Instituto de Defesa do Direito de Defesa (IDDD), reforçou: “Eu fui olhar os conceitos do filósofo francês Emmanuel Lévinas, que sustenta sua ideia de que é preciso, no conceito filosófico de alteridade, mais do que ser o outro e sim entender a singularidade de cada um e compreender essas distinções se colocando no lugar do outro. Eu acredito que esse conceito vem muito a calhar quando eu penso historicamente, porque já temos uma pequena trajetória no Innocence Project Brasil, mas os movimentos em prol da reversão e da identificação dos fatores multicausais da problemática do erro judiciário tem mais de 30 anos nos Estados Unidos”.

“Uma das grandes fontes de erros judiciais é que a prova produzida com base na memória seja a prova testemunhal, seja a prova do reconhecimento da vítima. Nós fomos formados em uma época que esse debate não existia. Sempre se falou da importância da interdisciplinaridade no Direito, mas colocar isso em prática é um grande desafio e só conseguimos iniciar as transformações no processo penal para um processo mais justo e equitativo, que efetivamente leva em consideração os direitos do acusado e o direito do Estado de punir, quando nos abrimos a outras áreas do conhecimento, sobretudo em matéria probatória”, pontuou o desembargador do Tribunal Regional Federal da 3ª Região (TRF3) José Marcos Lunardelli, professor do Mestrado Profissional da Enfam e doutor em Direito Econômico pela Universidade de São Paulo (USP).

A presidente do Fórum Permanente de Violência Doméstica, Familiar e de Gênero, desembargadora Adriana Ramos de Mello, coordenadora do NUPEGRE, professora da EMERJ e do Mestrado Profissional da Enfam e doutora em Direito Público e Filosofia Jurídico-Política pela Universidade de Barcelona, encerrou: “O reconhecimento é válido, mas ele não tem essa força probante absoluta. Grande parte dessas pessoas que estão presas e que são vítimas do erro judiciário são pessoas negras e corpos tidos como descartáveis, e suas vozes e argumentos não são ouvidos pelo Sistema de Justiça. Existe um preconceito e uma discriminação racial muito grande no Brasil que, por óbvio, estrutura as bases do Sistema de Justiça Brasileiro”.

Assista

Para assistir na íntegra, acesse: https://www.youtube.com/watch?v=bVc5ufhyJoI

 

Fotos: Jenifer Santos

18 de junho de 2024

Departamento de Comunicação Institucional (DECOM)