A Escola da Magistratura do Estado do Rio de Janeiro (EMERJ) recebeu, nesta terça-feira (13), o segundo dia da IX Semana de Valorização da Primeira Infância do Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro (TJRJ) e da IV Semana Estadual de Valorização da Primeira Infância. O tema do encontro deste ano é “Pela causa das infâncias: conversas sobre proteção, intersetorialidade e inclusão social”.
A reunião, promovida pelo Fórum Permanente da Criança, do Adolescente e da Justiça Terapêutica, aconteceu presencialmente no Auditório Desembargador Paulo Roberto Leite Ventura. Houve transmissão via plataforma Zoom com tradução simultânea para a Língua Brasileira de Sinais (Libras).
Mesa de Abertura
A psicóloga do Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro (TJRJ) Eliana Olinda Alves destacou durante a abertura: “Se vocês observarem a programação do evento, poderão perceber que ela apresenta o título do painel e o número de um eixo da política do Conselho Nacional de Justiça (CNJ). Todo o evento foi planejado e estruturado a partir desses eixos. Infelizmente, não conseguiremos contemplar todos eles, mas escolhemos alguns para estruturar a semana deste ano, no mês de agosto, que celebra a primeira infância e o aleitamento materno. Essas duas pautas são muito importantes quando pensamos no início da vida”.
Painel I: Situação de Crianças com Pais/Mães Privados de Liberdade (Eixo 21/CNJ)
Os temas expostos foram “Sistema Penal e Sistema de Garantias de Direitos: Interface com os Direitos de Mulheres Gestantes/Lactantes Privadas de Liberdade e Manutenção de Vínculos”, “Direito à Maternidade e (Des) Encarceramento Feminino no Brasil: Perspectivas Éticas e Jurídicas da Punição Criminal”, “Construindo Parcerias: A Experiência da SEAP com a Semana do Bebê” e “Desafios e Possibilidades na Garantia de Direitos de Mulheres Mães nas Audiências de Custódia”.
A juíza Roberta Barrouin Carvalho de Souza afirmou: “O Amparando Filhos é mais um desses grupos de trabalho intersetoriais com a finalidade de elaborar políticas públicas voltadas para os apenados do sistema carcerário e suas necessidades sociais. Esse grupo surgiu da necessidade de cumprir diversas normas e ordenamentos jurídicos que versam sobre a proteção das crianças e dos adolescentes. Esses dispositivos podem ser encontrados na Constituição, na Convenção Internacional dos Direitos da Criança, no Estatuto da Criança e do Adolescente, na Convenção sobre os Direitos da Criança ratificada pelo Brasil, no Marco Legal da Primeira Infância e em muitas outras legislações que visam à proteção das nossas crianças e adolescentes. Todos esses regramentos têm em comum o princípio de que é dever do Estado, e não apenas do Estado, mas também da sociedade, proteger nossas crianças e adolescentes”.
“Fiquei muito feliz ao ver a programação do evento e acredito que vocês também devem ter notado isso, pois hoje somos convidados a falar pela causa das infâncias. O Fórum e a EMERJ tiveram o cuidado e a delicadeza de tornar o evento plural, abordando várias infâncias e aspectos diferentes. A programação é bastante densa e abrangente, e gostaria de parabenizar a EMERJ e o Fórum, não apenas por manter a visibilidade do tema, que já é emblemático, mas principalmente por apresentá-lo de maneira plural e coletiva. Vamos discutir intersetorialidade e inclusão social, temas tão relevantes e importantes no dia a dia do sistema de Justiça, mas que, por vezes, são tratados de forma secundária”, salientou Luciana Simas Chaves de Moraes, doutora em Bioética, Ética Aplicada e Saúde Coletiva pela UFRJ.
Aline Camilo, coordenadora das Unidades Prisionais Femininas e LBGTQIA+, expôs: “É muito importante para a Secretaria de Estado de Administração Penitenciária (Seap) participar deste evento e desse contexto. Observamos avanços no desencarceramento e no acolhimento, não apenas das crianças que estão na unidade materno infantil, mas também daquelas que, embora maiores e não acolhidas, vivem com seus familiares em famílias extensas enquanto suas mães estão privadas de liberdade. Quando pensamos em polícia penal e na Seap, geralmente imaginamos o agente ressocializador responsável por manter a pessoa privada de liberdade e proteger a sociedade. No entanto, a polícia penal vai muito além disso e envolve muitas outras questões. Precisamos aprender a ser mais sensíveis, e confesso que ter uma mulher à frente da Secretaria ajudou a resolver muitas questões, pois a mulher traz um olhar diferenciado. Hoje, o Rio de Janeiro é um dos poucos estados com uma coordenação exclusivamente feminina. A Seap possui uma coordenação dedicada às mulheres privadas de liberdade e à população LGBTQIA+, justamente para garantir esse olhar diferenciado, não apenas em relação ao status de privado de liberdade, mas considerando as particularidades individuais”.
“É muito gratificante e uma honra compartilhar a mesa com mulheres tão queridas e parceiras. A colaboração e o apoio mútuo são essenciais para o que construímos, e isso só é possível porque firmamos parcerias sólidas e pensamos o trabalho, de fato, em rede. Cada um de nós contribui a partir de diferentes perspectivas e experiências, ocupando seus espaços e realizando seu papel de maneira única. Construir essas trocas e fortalecer essa rede de apoio aqui é algo de extremo valor, pois enriquece nosso trabalho e potencializa o impacto das nossas ações”, finalizou a psicóloga Ana Camilla de Oliveira Baldanzi, mestra em Psicologia Social pela Uerj.
A psicóloga do TJRJ Eliana Olinda Alves conduziu a mediação do painel.
Painel II: Fórum Maternidades, Crianças e Adolescentes em Situação de Rua e Migração (Eixo 16/CNJ)
“Acesso à Documentação Civil: Políticas Públicas e Garantias de Direito”, “A Situação de Mulheres Mães e/ou Gestantes nas Ruas e o Diálogo entre os Serviços” e “Desafios Intersetoriais no Processo de Rualização de Crianças e Adolescentes” foram as exposições da mesa.
Fernanda Ferreira Nunes da Silva, mestra em Políticas Públicas em Direitos Humanos pela UFRJ, frisou: “Para uma pessoa vulnerável que perde todos os documentos é necessário enfrentar uma verdadeira via-crúcis para conseguir obter cada um deles. Ela enfrenta diversas barreiras de acesso, que vão desde a desinformação – não sabe onde ir e quais documentos são necessários – até o histórico de sub-registros que atravessam gerações. Muitas vezes, a avó não tem registro civil, e isso se reflete na filha e na neta. Essa situação impede e perpetua a dificuldade ao longo das gerações. O analfabetismo funcional também é uma barreira significativa, muitas pessoas não sabem ler ou, se sabem, têm dificuldade em interpretar o que está escrito, especialmente com tantos fluxos de locais e pré-requisitos para acessar os documentos. Além disso, muitas vezes falta dinheiro para transporte. Muitas pessoas que utilizam nossos serviços na política de assistência chegam a pé”.
“Quando fui convidado para compor esta mesa, não me dei conta do desafio que vinha com o convite: falar sobre um tema tão complexo e desafiador quanto a situação de mulheres mães e/ou gestantes nas ruas e o diálogo entre os serviços. Enfrentei uma encruzilhada e, por isso, decidi abordar apenas o que pode parecer óbvio, mas que nem sempre é tão evidente para quem lida com a realidade dos serviços públicos, sociais e do sistema de Justiça. Estamos diante de um momento ímpar na história deste país: nunca se falou tanto sobre racismo, LGBTQIA+fobia, capacitismo, machismo e outros marcadores sociais da desigualdade. Nunca produzimos tantas evidências sobre como essas relações moldam a formação social e política do povo brasileiro”, reforçou Gilney Costa, doutor em Saúde Pública pela Escola Nacional de Saúde Pública Sérgio Arouca da Fiocruz (ENSP/Fiocruz).
Giovanna Bueno Ginacchi, doutora em Política Social pela Universidade Federal Fluminense (UFF), concluiu: “Percebo que há um grande intercâmbio entre a rua e o acolhimento institucional, o que evidencia a complexidade das situações enfrentadas por pessoas em vulnerabilidade. Compreendo que as políticas intersetoriais de qualidade desempenham um papel crucial na diminuição da incidência da rualização tanto para adultos quanto para crianças. Essas políticas integradas ajudam a criar uma rede de apoio que pode prevenir a permanência e o agravamento da situação de rua. Frequentemente discutimos qual direito deve ser priorizado: o da mãe ou o da criança. No entanto, essa discussão muitas vezes nos desvia do foco principal, que é garantir a proteção e os direitos de ambos. Na realidade, não estamos assegurando adequadamente os direitos de nenhuma das partes envolvidas”.
A mediação foi de responsabilidade da psicóloga do TJRJ Marcele de Mendonça Santos, especialista em Serviço Social pela UFRJ.
Painel III: Proteção Contra o Trabalho Infantil (Eixo 13/CNJ)
As pautas apresentadas na terceira mesa foram “O Trabalho Dignifica o Homem?”, “Trabalho Infantil Não é Brincadeira – Criança Não Trabalha” e “Trabalho Infantil: A Continuidade da Violação de Direitos Humanos”.
Joana Garcia, professora titular e pesquisadora da Escola de Serviço Social da UFRJ, declarou: “No processo histórico pelo qual nos tornamos seres humanos, surge a atividade que denominamos trabalho, como algo específico do homem, inerente e constitutivo. Não podemos falar de seres humanos e de sua condição social sem considerar o trabalho. Um autor por quem eu tenho profunda simpatia é o Leandro Konder, que também aborda a condição do trabalho como uma dimensão ontológica para os seres sociais. Konder afirma que toda sociedade vive do que consome e, para consumir, depende da produção, ou seja, do trabalho. Além disso, toda sociedade se perpetua porque cada geração cuida da formação da geração seguinte, transmitindo-lhe parte de sua experiência”.
“O título ‘Trabalho Infantil Não é Brincadeira – Criança Não Trabalha’ reflete uma premissa que deveria ser inquestionável e universalmente compreendida. Garantir que crianças e adolescentes não sejam submetidos ao trabalho infantil é o mínimo que devemos oferecer a todos, especialmente na primeira infância, que é um período crucial para o desenvolvimento saudável. Essa premissa não é apenas fundamental, mas deve servir como base para toda a nossa discussão e desconstrução dos mitos que cercam o trabalho infantil. Infelizmente, esses mitos muitas vezes ganham uma proporção exagerada e distorcem a realidade, criando uma compreensão errônea sobre a gravidade e a ilegalidade do trabalho infantil”, palestrou a defensora pública Eufrásia Maria Souza das Virgens, titular da 1ª Defensoria Pública de Defesa da Criança e do Adolescente na Coordenadoria de Defesa dos Direitos da Criança e do Adolescente (CDEDICA).
A economista Maria América Ungaretti Diniz Reis, membra da diretoria do Fórum Nacional de Prevenção e Erradicação do Trabalho Infantil (INPETI), trouxe dados sobre o trabalho infantil e relatou: “A região Norte do Brasil apresenta a maior proporção de crianças e adolescentes em situação de trabalho infantil, com cerca de 7,4%. O Pará lidera o ranking regional, com mais de 191 mil crianças e adolescentes de 5 a 17 anos. Bahia e Maranhão têm os maiores números absolutos de trabalho infantil: 187 mil e 100 mil, respectivamente. O Piauí, por sua vez, possui a maior proporção na região Nordeste, com cerca de 8,3%. No Sudeste, Minas Gerais apresenta a maior proporção, de 6,6%, enquanto São Paulo lidera em números absolutos, com quase 272 mil. Na região Sul, o Rio Grande do Sul conta com 5,5%, seguido pelo Paraná com 5,3%. No Centro-Oeste, Mato Grosso tem uma proporção de 7,2%, seguido por Goiás com 5,2%”.
O psicólogo Raum Batista, assessor técnico do Instituto Terra dos Homens, ficou a cargo da moderação.
Assista
Para assistir na íntegra, acesse: https://www.youtube.com/watch?v=n5Dw4_C4jzs e https://www.youtube.com/watch?v=H7Z46lsqJmU
Fotos: Maicon Souza
13 de agosto de 2024
Departamento de Comunicação Institucional (DECOM)