Nesta segunda-feira (17), a Escola da Magistratura do Estado do Rio de Janeiro (EMERJ) promoveu, por meio do Fórum Permanente de Diálogos da Lei com o Inconsciente e do Núcleo de Pesquisa em Políticas Públicas e Acesso à Justiça (NUPEPAJ), o evento Diálogos entre Educação e Cultura no Brasil – Cidadãos ou Internautas?
O encontro aconteceu presencialmente no Auditório Desembargador Paulo Roberto Leite Ventura. Houve transmissão via plataforma Zoom, com tradução simultânea para a Língua Brasileira de Sinais (Libras).
A reunião teve como foco questões relativas aos direitos das crianças, às infâncias e à formação de professores. Também abordou a formação de profissionais do Direito conscientes no Brasil do século XXI, com destaque para uma educação sem racismo.
Abertura
A presidente do fórum e doutora em Direito pela Universidade Veiga de Almeida (UVA/RJ), desembargadora Cristina Tereza Gaulia, declarou: “O evento falará de educação, uma educação dialogada e uma educação ligada à cultura. E por que a cultura é tão importante? Ou melhor, por que precisamos falar de cultura em uma escola de juízes? A cultura é o que permite ao juiz e ao profissional do Direito, de um modo geral, abrir-se para o mundo, obtendo o conhecimento necessário para a melhor aplicação das leis e do Direito, ferramentas com as quais esses profissionais, que são técnicos, trabalham. Eu abro um parêntese aqui, porque muitas vezes eu escuto as pessoas se referirem ao juiz como pessoa muito culta e, na verdade, há uma confusão do conceito de cultura. Na verdade, o juiz é um técnico, e não há nisso nenhum desdouro. Ele é um técnico e ele tem que ser um técnico, porque a lei é a nossa salvaguarda. Mas isso não quer dizer que ele deva ser somente um técnico. Um juiz que seja um bom técnico e, ao mesmo tempo, seja um juiz aberto para o mundo da cultura, arte, teatro, audiovisual, cinema, música, poesia, literatura, será, indubitavelmente, um juiz melhor.”
Palestrantes
A professora adjunta do Departamento de Ciências Humanas do Instituto do Noroeste Fluminense de Educação Superior (INFES) e da Universidade Federal Fluminense (UFF), Virginia Georg Schindhelm, coordenadora do Núcleo de Pesquisas e Estudos em Educação e Infâncias (NUPEDIS) e doutora em Educação pela UFF, destacou: “As tecnologias alteraram as formas de brincar e de se relacionar das crianças, na medida em que os objetos eletrônicos se tornaram os novos brinquedos e alteraram suas formas de brincar e de tempo livre. Trouxeram novas linguagens e novas necessidades de consumo. A criança fica passiva e imóvel, enquanto a tecnologia se movimenta, age, fala e canta. É o objeto que brinca com a criança, e as telas viram companhias para as infâncias. No entanto, como psicóloga e educadora, defendo que a atividade de brincar é mais importante que o brinquedo e que a interação humana é fundamental para as infâncias, na medida em que afeta diretamente a linguagem e a capacidade de simbolização e criatividade. Além disso, os dispositivos eletrônicos não promovem investimentos afetivos fundamentais para a subjetivação das crianças. Crianças precisam criar laços sociais nas diferentes instituições nas quais se inserem: famílias, escolas e comunidades. Ao brincar, a criança vive experiências sensoriais e desenvolve cognição, criatividade, imaginação e fantasia. Os dispositivos eletrônicos limitam essas experiências ou não as promovem.”
O doutor em Educação pela UFF e professor adjunto do INFES da UFF, Fernando de Souza Paiva, pontuou: “Eu tenho um sentimento de gratidão muito grande por ter sido convidado nesta manhã para dialogar com este fórum, que se abre para além de ser o costumeiro espaço de formação, pensando em educação e cultura no Brasil, um país tão diverso e, ao mesmo tempo, prestando-se a pensar a questão do direito à cidadania em uma era de intensos avanços tecnológicos, onde, por um lado, a inteligência artificial assume o papel de proeminência, e, por outro, os desafios para o acesso à educação e às modernas tecnologias ainda se constituem como uma realidade presente e premente para uma vultosa parcela das famílias brasileiras, notadamente no interior fluminense, onde transito e pelo qual tenho imenso carinho, e onde a desigualdade ficou latente, principalmente, na pandemia da Covid-19. Como tivemos dificuldades de nos comunicar nessa época, só nesse período é que pudemos perceber as lacunas que ainda temos em uma era de intensa tecnologia, onde desponta a inteligência artificial, mas ainda temos um saldo devedor muito grande nesse caminho.”
A membra do fórum Solange Ferreira de Moura, doutora em Direito pela Universidade Estácio de Sá (Unesa), ressaltou: “A reflexão jurídica tem que estar voltada para o novo paradigma de interpretação constitucional que priorize o respeito aos direitos humanos, valorize a garantia do Estado Democrático de Direito e busque a sustentabilidade do planeta. Toda e qualquer educação hoje, jurídica ou não, deve ter como eixo transversal a educação para um mundo sustentável. Não há como educarmos sem termos essa visão clara de que precisamos mudar os nossos padrões de consumo e de desenvolvimento. Temos que colocar o ser humano como sujeito da educação, inserido num contexto socioeconômico, cultural, político e histórico. Isso tem uma dimensão ativa, criadora e renovadora na sua interação com outros seres e com o meio. O conhecimento é produto dessa interação social, e o papel da educação é trabalhá-lo na perspectiva de sua produção e preservação, colocando-o a serviço da sociedade por meio da participação dos indivíduos como sujeitos da sociedade, da cultura e da história, priorizando a autonomia, a problematização e a conscientização.”
A presidente da Advocacia Preta Carioca e advogada familiarista, Angela Borges Kimbangu, concluiu: “Os brasileiros negros não têm nome africano porque não sabemos a nossa história. A forma de vida africana compreende essa soma de saberes ancestrais, a oralidade, os movimentos da natureza e a vida em comunidade, e isso, para nós, é educação. Não existem os meus filhos ou minhas filhas, existem os nossos filhos. Se alguém convive com algum africano, percebe-se que ele diz que qualquer outro africano é irmão dele, a gente e o povo dele. Em 1871, a Lei do Ventre Livre dizia que os filhos de mulheres escravas estariam, entre aspas, livres. E essa mãe fica diante da impotência que nós ainda, mulheres pretas, sentimos em relação aos nossos filhos com a violência do Estado e desse mundo e orientamos: não use boné, não use casaco, corte o cabelo curto. Porque sabemos que criança, e antigamente não eram as crianças que morriam no Estado brasileiro, mas hoje vemos, a todo momento, na televisão, que mataram uma criança em uma incursão policial. Essa criança morta sequer tem o direito de sonhar com educação, porque sua vida é ceifada na primeira ou na segunda infância.”
Debatedora
A juíza Cláudia Maria de Oliveira Motta participou do encontro como debatedora.
Assista
Para assistir na íntegra, acesse: https://www.youtube.com/watch?v=uKK4CHH52Ss
Fotos: Jenifer Santos
17 de fevereiro de 2025
Departamento de Comunicação Institucional (DECOM)