Nesta sexta-feira (23), O Fórum Permanente de Inovações Tecnológicas no Direito e o Fórum Permanente de Justiça Multiportas, Mediação e Justiça Restaurativa, ambos da Escola da Magistratura do Estado do Rio de Janeiro (EMERJ), em conjunto com o Núcleo Permanente de Métodos Consensuais de Solução de Conflitos (NUPEMEC) e a Escola de Mediação (EMEDI), ambos do Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro (TJRJ), promoveram o encontro Justiça 4.0, Inovação e as Novas Plataformas.
O evento aconteceu presencialmente no Auditório Desembargador Paulo Roberto Leite Ventura. Houve transmissão via plataforma Zoom, com tradução simultânea para a Língua Brasileira de Sinais (Libras).
Abertura
O diretor-geral da EMERJ e mestre em Ciências Penais pela Universidade Candido Mendes (Ucam), desembargador Cláudio Luís Braga dell'Orto, declarou: “Eu costumo dizer que esta é uma reunião de cruzados, e estamos aqui em uma verdadeira cruzada. A conselheira Daniela Madeira é uma das nossas líderes nessa jornada em prol da implantação de sistemas tecnológicos no Poder Judiciário — sistemas que permitam o enfrentamento das demandas sem que isso dependa, apenas, de uma progressão geométrica de pessoas. Não podemos mais aceitar que a forma de resolver os conflitos — que tendem a surgir cada vez mais na sociedade, inclusive em razão das próprias inovações tecnológicas — continue sendo a mesma adotada desde o direito romano. Não podemos mais atuar dessa maneira.”
O presidente do Fórum Permanente de Inovações Tecnologias no Direito e juiz auxiliar no Supremo Tribunal Federal (STF), Anderson de Paiva Gabriel, destacou: “A revolução tecnológica tem ocorrido em uma dimensão e velocidade impressionantes, e as instituições públicas, entre as quais se inclui o Poder Judiciário, não podem ficar de fora. Tenho absoluta certeza de que o Judiciário brasileiro está na vanguarda desse processo, quando comparado a poderes judiciários ao redor do mundo. Acredito ser fundamental que superemos o complexo de vira-lata que, por vezes, nos faz pensar que outros países estão à nossa frente. Em matéria de inovação e tecnologia, posso assegurar que o Judiciário brasileiro é motivo de grande orgulho para o nosso país. Parte disso se deve ao querido amigo, juiz Fábio Ribeiro Porto, que, quando esteve à frente do DTI na gestão do ministro Luiz Fux, contribuiu para o desenvolvimento do programa Justiça 4.0, idealizado e criado pelo ministro Fux durante sua gestão à frente do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), e que teve continuidade agora com o ministro Luís Roberto Barroso e sua expansão.”
O presidente do Fórum Permanente de Justiça Multiportas, Mediação e Justiça Restaurativa, do NUPEMEC/TJRJ e do Conselho de Administração da EMEDI e coordenador do Projeto da Plataforma + Acordo, desembargador Cesar Cury, salientou: “Fico muito satisfeito em realizar mais uma edição dessa parceria profícua entre os fóruns permanentes, coordenados por mim e pelo juiz Anderson de Paiva Gabriel, que têm trazido temas relevantes e gerado boas reflexões. Hoje, o tema é especialmente importante para o público aqui presente, pois estamos tratando da relação entre o Direito e a tecnologia, uma relação que se estabeleceu recentemente e cuja imbricação é irreversível. O Direito e a tecnologia já não se dissociam mais, muito pelo contrário, essa integração continuará e se desenvolverá de forma absolutamente vertiginosa, tanto pelas próprias características do desenvolvimento tecnológico e científico, quanto pelas repercussões que trará. Isso exigirá uma revisão não apenas da prática jurídica, mas, sobretudo, dos pressupostos teóricos do Direito, que precisarão ser modificados em função de sua assimilação pela tecnologia. Esse será o grande desafio da nova geração de juristas que agora adentra o universo jurídico.”
A conselheira do CNJ e presidente do Comitê de Inovação do CNJ, juíza federal do Tribunal Regional Federal da 2ª Região (TRF2) Daniela Madeira, enfatizou: “Sobre os grandes desafios da inovação dentro do Poder Judiciário, acredito que enfrentamos dois principais obstáculos. O primeiro é a capacitação, e não apenas de magistrados e servidores no uso de ferramentas tecnológicas. Quando houve a transição da escrita manual para a máquina de escrever, o Tribunal de Justiça do Estado do Paraná chegou a anular uma sentença redigida por máquina de escrever, sob o argumento de que não era possível identificar a autoria daquela decisão. Ou seja, o que percebemos é que o debate muda de uma geração para outra, e hoje vivemos situação semelhante em relação à inteligência artificial. Sempre que passamos de uma cultura ou mentalidade para outra, há grande resistência. Por isso, é fundamental lembrar que, embora utilizemos ferramentas tecnológicas, a supervisão humana é indispensável — e nada a substituirá. O segundo desafio diz respeito à multiplicidade de sistemas processuais no Brasil. Atualmente, enfrentamos a realidade de termos uma grande quantidade de sistemas distintos, o que dificulta a integração e a eficiência. Um avanço importante promovido pelo CNJ foi o Jus.BR: uma plataforma unificada, com acesso centralizado, que conecta os tribunais e representa um passo significativo para a superação dessa fragmentação. O CNJ vem liderando esse tipo de iniciativa para facilitar o uso dessas ferramentas e promover maior integração no Sistema de Justiça.”
O membro do Fórum Permanente de Inovações Tecnológicas no Direito e professor titular de Direito da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (Uerj), desembargador Humberto Dalla, ressaltou: “Sem dúvida nenhuma, o Judiciário brasileiro está hoje na vanguarda mundial. Acredito que não exista nenhum Judiciário em outro país que tenha a quantidade de inovações que estamos implementando, assim como a variedade de ferramentas disponíveis. Todo o esforço tem sido no sentido de facilitar o acesso à Justiça e oferecer soluções que sejam, de fato, rápidas e efetivas. Hoje, vamos assistir a uma apresentação de diversas questões e inovações, incluindo, em primeira mão, uma ferramenta absolutamente extraordinária desenvolvida pelo desembargador Cesar Cury e sua equipe: o + Acordo. Não temos nenhuma dúvida de que essa iniciativa vai revolucionar a forma como as conciliações, mediações e transações são realizadas no TJRJ.”
A presidente da Associação dos Magistrados do Estado do Rio de Janeiro (Amaerj), juíza Eunice Haddad, e o vice-presidente do Fórum Permanente de Inovações Tecnológicas no Direito, juiz Fabio Ribeiro Porto, também compuseram a mesa de abertura.
Palestras de abertura
O diretor-geral da Faculdade Baiana de Direito e professor titular da Universidade Federal da Bahia (UFBA), Fredie Didier Jr., proferiu a primeira palestra do evento e salientou: “É absolutamente fundamental, e concordo com o que disseram os desembargadores Cesar Cury e Humberto Dalla: o Judiciário brasileiro está na vanguarda nesse ponto, e é essencial que nos debrucemos sobre esses assuntos, porque o Sistema de Justiça brasileiro mudou completamente. Nós, estudiosos do Direito, nos acostumamos a estudar o Direito em três dimensões: a dimensão dos atos normativos e das leis; a dimensão do estudo da doutrina, sobretudo aqui no Brasil; e a dimensão das decisões judiciais, os precedentes. Esses três objetos de estudo são bastante consagrados, mas há um quarto objeto, ou pelo menos deveria haver, que costuma ficar à margem e passar despercebido: a dimensão prática do Direito. E, ao falar em dimensão prática, refiro-me ao modo como o Direito vem sendo concretizado — não no sentido de precedentes, mas na forma como as coisas são feitas: o modo como um juiz conduz um processo estrutural, como se colhem provas em uma audiência, entre outros aspectos. Perceba que nada disso tem a ver com precedentes, doutrina ou leis. Tem a ver com tecnologia. E tecnologia não é apenas desenvolver programas de computador ou eletrônicos; é também o conjunto de métodos e técnicas para aplicar o conhecimento científico e melhorar a vida das pessoas. Essa tecnologia também se manifesta no modo de agir do juiz no exercício de suas funções.”
1º Painel – Inovação Púbica no Brasil e no Mundo
A professora da Universidade de Santiago de Compostela (USC) Sandra Sindre pontuou: “As ferramentas de inovação pública aberta variam em sofisticação, escalabilidade e recursos necessários. Temos os hackathons, que são momentos intensos e curtos para gerar ideias com muitos participantes que recebem prêmios; os programas de retos públicos de inovação, que identificam desafios e lançam ao ecossistema de inovação com apoio de plataformas tecnológicas; a compra pública de inovação, que alinha as áreas de contratação, inovação e empreendedorismo para escalar soluções; e, por fim, as aceleradoras corporativas públicas, talvez o estágio mais avançado, oferecendo acompanhamento técnico, financiamento, compra de resultados e incubação de startups. Esse é o desenvolvimento que já ocorre em nível internacional.”
O assessor de Relações Institucionais do CNJ e coordenador do Projeto Contrato Público de Solução Inovadora (CPSI/CNJ), Thiago Gontijo Vieira, ressaltou: “Sobre a ideia da cocriação de soluções — e cocriação é uma palavra que traz, em sua semântica, a percepção de andar de mãos dadas e de unir atores internos e externos com o objetivo de criar soluções que beneficiem a todos —, algo que me chamou muita atenção é que estamos em um momento-chave. Assim como ocorreu no passado, com a implementação da máquina de datilografia, este é um momento histórico em que podemos transformar toda a nossa realidade por meio de uma mudança de mindset. Trata-se de uma nova mentalidade, que visa superar as antigas desconfianças do direito administrativo, permitindo que possamos contratar e colaborar de maneira aberta para a criação de soluções verdadeiramente disruptivas.”
O professor da Uerj Rafael Viola destacou: “Quando falamos de administração pública, observamos que ela vem passando por uma transformação digital muito significativa nos últimos anos. Embora isso seja verdade, é curioso notar que a Secretaria de Transformação Digital do Município foi criada apenas em 2021. Considero que o Poder Judiciário está muito à frente de outros Poderes, pois desde 2009 já se fala em processo eletrônico e em mudanças na forma de atuação do Judiciário. Lembro que, no Estado do Rio de Janeiro, a implementação do SEI ocorreu a partir de 2019. Para quem não conhece, o SEI é o Sistema Eletrônico de Informações — um processo eletrônico que, embora importante, representa apenas a digitalização do papel físico, sem incorporar grandes inovações tecnológicas, como ferramentas de inteligência artificial preditiva. No entanto, é verdade que, especialmente nos últimos anos, temos assistido a uma transformação intensa. Nos últimos quatro anos, o município promoveu uma mudança muito significativa do ponto de vista das políticas públicas.”
A mesa foi presidida pelo vice-presidente do Fórum Permanente de Inovações Tecnológicas no Direito, juiz Fabio Ribeiro Porto.
2ª Painel – Tecnologia, Solução de Disputas e o Projeto + Acordo
O juiz coordenador do NUPEMEC, Francisco Posada, salientou: “O TJRJ, por meio do NUPEMEC (Núcleo Permanente de Métodos Consensuais de Solução de Conflitos), atua como o designer de sistemas de disputas do Tribunal. Isso significa que o NUPEMEC estrutura mecanismos adequados para determinados tipos de conflito que se apresentam. Por exemplo, em 2016, o NUPEMEC desenhou o sistema de disputas para o processo de recuperação judicial da Oi. Na ocasião, foi desenvolvida uma plataforma de adesão que possibilitou que 60 mil credores pudessem aderir à proposta da empresa, viabilizando, assim, a realização da assembleia geral de credores. Portanto, o NUPEMEC tem essa atribuição no TJRJ: atuar como o designer de sistemas de disputas, o que se concretiza em diversos outros casos. Em linha com essa função, o NUPEMEC, por meio de parceria com a PUC-Rio, desenvolveu a plataforma + Acordo, que se divide em três fases: ODR Institucional do TJRJ, Produção Antecipada de Provas e Execuções.”
O presidente do Fórum Permanente de Justiça Multiportas, Mediação e Justiça Restaurativa, do NUPEMEC/TJRJ e do Conselho de Administração da EMEDI, coordenador do Projeto da Plataforma + Acordo, desembargador Cesar Cury, também compôs a mesa de debate. O painel foi presidido pelo membro do Fórum Permanente de Inovações Tecnológicas no Direito e professor titular de Direito da Uerj, desembargador Humberto Dalla.
3ª Painel – Plataformas Digitais e os Novos Modelos de Negócio
A integrante do Fórum Permanente de Inovações Tecnológicas no Direito e professora do IBMEC, Chiara de Teffé, ressaltou: “Esse evento é extremamente importante e é mais do que fundamental pensarmos na Justiça 4.0 e em questões relacionadas às plataformas e à inovação. Trata-se de uma temática essencial. Hoje, as plataformas desempenham um papel muito relevante na sociedade, isso é inegável. São espaços de expressão, inovação e participação política. Além disso, impulsionam a economia, novos serviços e o surgimento de novas profissões. Tudo isso é inegociável. Contudo, à medida que essas plataformas crescem, também aumentam os desafios. Enfrentamos danos e é justamente por isso que se torna tão importante pensarmos em uma regulação — mas uma regulação que seja equilibrada, que leve em consideração o desenvolvimento de novas tecnologias, a liberdade de expressão e a proteção dos direitos fundamentais.”
A professora da UFBA Daniela Bomfim destacou: “Na UFBA, coordeno, junto a outros professores, um grupo de pesquisa sobre Direito, Inovação e Tecnologia. No último ano, realizamos encontros sobre contratos empresariais e tecnologia. Entre os professores e professoras que coordenam o grupo, eu me considero a menos tecnológica e, durante as discussões, sempre levantava uma questão na mesma linha: ‘Como compreender relações contratuais e esses contratos por meio da tecnologia à luz da nossa dogmática atual? Como colocá-los nas caixinhas jurídicas que temos hoje?’ E, quando falo em caixinhas jurídicas, não me refiro necessariamente à tipicidade ou a relações contratuais típicas, mas, sim, a como compreendê-los à luz das ferramentas, dos institutos e dos conceitos jurídicos positivos que temos atualmente nos sistemas. E a premissa, ao que me parece, é o autorregramento.”
A professora da Universidade Estácio de Sá (Unesa) Maíra Almeida enfatizou: “Quando falamos sobre qualquer modelo, sejam plataformas digitais ou modelos de negócios, enquanto publicistas, nosso primeiro olhar se volta para a lei. Por isso, é muito importante observar como o país está regulando determinado tema: essa é a questão central. Olhando para o Brasil e para a experiência brasileira, como já destacaram os palestrantes que me antecederam, nós ainda não temos uma legislação específica, mas há um projeto de lei em andamento na Câmara dos Deputados. É esse projeto que trago para análise. Antes, porém, gostaria de falar sobre experimentalismo. Quando tratamos de um novo modelo legal e estamos lidando com inovação, é fundamental pensarmos em regulação. E, ao falarmos de regulação, é necessário lembrar dos países que primeiro trataram do experimentalismo: Estados Unidos e Canadá. Esse conceito surge na ciência política como uma forma de garantir uma renovação contínua e uma dinâmica constante da administração pública.”
A mesa foi presidida pelo membro do Fórum Permanente de Inovações Tecnológicas no Direito, advogado e professor de Direito Processual da Uerj, Rodrigo Fux.
Assista
Para assistir na íntegra, acesse: https://www.youtube.com/watch?v=Qpxm-p6qBPM
Fotos: Jenifer Santos
23 de maio de 2025
Departamento de Comunicação Institucional (DECOM)